Trabalho num instituto de saúde federal há 12 anos. Um tempo que voou, pois às vezes me sinto como se meu ingresso fosse recente. Tempo este que me proporcionou muita aprendizagem, não só em termos funcionais, mas principalmente humanos.
Trabalho num instituto de saúde federal há 12 anos. Um tempo que voou, pois às vezes me sinto como se meu ingresso fosse recente. Tempo este que me proporcionou muita aprendizagem, não só em termos funcionais, mas principalmente humanos. |
Quando mudanças no quadro de pessoal me levaram a aprender os macetes da agenda de exames de tomografia, ultrassom e ressonância, em 2013, passei a ter relação mais próxima com o público. Com vários pacientes fiz amizade, o que considero um prazer inestimável para nosso bem-estar mental, físico e psicossocial. |
Daí vieram os presentes físicos e orais, ambos muito positivos, diga-se de passagem. Mas os orais chamam a atenção pela expressão máxima da gratidão dos pacientes e familiares por se sentirem bem atendidos. Uma surpresa para alguém escaldado com sucessivos atos ingratos. Pois não eram elogios, e sim agradecimentos simples e espontâneos. |
Com a sindemia de C19 me afastei, 6 meses de home-office e depois, 1 ano de licença médica imposta pelo meu médico que considerou meu prognóstico clínico como "reservado". Tempo à beça. Foi licença de risco-C19 e não pela comorbidade em si. Até, pra meu alívio, eu retornar em 19/10 e absorver as profundas mudanças funcionais, sem agendar exames. |
Nessa segunda semana útil já na fase final, ocorreu mais um da série de testemunhos que tenho recebido de pacientes e colegas da instituição pública onde presto meus serviços. Após bater meu ponto de entrada e tomar um cafezinho, revi um casal de pacientes que me reconheceu. |
Um casal idoso, meio hippie, a mulher com vestes coloridas e tatuagens indianas nas mãos, e o esposo com abundante barba, jeans e o chapéu com um véu protetor da cabeça, típico dos que fazem explorações de campo para se protegerem do Sol forte. Eles me reconheceram antes de eu vê-los, e no papo rápido, lançaram a quarta pérola dessas duas semanas: |
- Sentimos muito a sua falta aí. É diferente a sua abordagem, ela é completa e vc fala olhando nos olhos da gente com respeito e humanidade - disse o homem, paciente a quem atendi algumas vezes nesses anos. |
- Sério? Bem.... fico muito agradecida pela consideração. - agradeci. - Atualmente entrou outro servidor e eu fiquei fora de agendar os exames, daí meu atendimento para o público será bem restrito. |
- Não tem problema. O que importa é vc estar de volta, e isso é uma alegria pra nós. |
Sim, galerinha, é a quarta vez, só nessa semana, que escutei essa pérola. De uma enfermeira e de três pacientes. Não espero recompensas, nem elogios, pois encaro meu serviço como normal a todo servidor público, mesmo sujeito à nossa natural falibilidade. |
Por trás dos olhares e expressões sisudas e aparentemente engessadas, nós servidores temos nossa humanidade. E nela temos muito de positivo a oferecer, mesmo q não saibamos. Isso torna a nossa luta contra a PEC32 ainda mais necessária e urgente, pra evitar q servidores sejam substituídos por gente de caráter e ética desumanos. |
ROSSINI, Salete. Diários de hospital - testemunhos. In: ______. Cenas da vida urbana, crônicas do real, outubro 2021. |