Não se trata de um filme com o Ethan Hawke.
0
0

Não se trata de um filme com o Ethan Hawke.

Colin Firth, John Cusak, Hugh Grant, Pierce Brosnan...

Randall Neto
6 min
0
0
Email image

Colin Firth, John Cusak, Hugh Grant, Pierce Brosnan...

Será que o Nick Hornby tem alguma influência na escolha dos protagonistas dos filmes dele?

Sendo mais específico: será que ele faz questão de escolher atores que eu gosto?

Porque eu tenho certeza que o Nick Hornby escreve pra mim. Algumas pessoas têm autores favoritos, eu tenho um amigo que escreve livros pra mim.

Ok, em “Funny Girl” eu acho que ele pensou em outra pessoa, eu perdôo, mas os outros... eu tenho certeza que ele ME conhece. E a partir da massa bizarra de elementos que formam a minha personalidade, ele cria os personagens.

Deve ter em alguma entrevista, ele explicando o processo criativo, ele deve estar falando de mim.

Por exemplo... esses protagonistas dele... ele consegue retratar com muita exatidão, duas características primordiais na minha psiquê.

1- Aquelas qualidades únicas, singulares, exóticas, muito pouco convencionais e que exigem um certo repertório para serem reconhecidas e que, de certa forma, fazem as pessoas se apaixonarem por mim. Não só namoradas e coisas do tipo. Amigos. Chefes. Colegas de trabalho. Mas sobretudo, namoradas e coisas do tipo.

2- Os defeitos, não tão únicos, nem muito singulares, alguns exóticos e outros incompreensíveis, que fazem não apenas as pessoas se desapaixonarem de mim, mas criar um certo ranço que evolui para outra coisa e talvez, como o Riacho do Navio que corre para o Pajeú e São Francisco, desembocam num mar de ódio e outras coisas.

Algunas pessoas - pegando o gancho dessa música maravilhosa do Gonzagão -, se imaginam um peixe que, ao contrário do Rio, nada contra o mar nesse desafio... esperando aquela coisa de dormir com chocalho e acordar com a passarada?

Não sei.

Mas hoje eu entendo tanto as pessoas se apaixonam por mim e também as que me odeiam.

Como diz o Phil Jackson, o segredo da boa gestão é manter os indecisos longe dos que te odeiam.

Não sei se mantenho pessoas indecisas ao meu respeito por mais de 5 minutos.

E até a última recontagem dos votos da Flórida, a parcela dos que me odeiam estava perdendo feio, inclusive tenho muito orgulho de uma parcela dessa população votante me odiar, quase boto no meu currículo: “Fulano me odeia”.

Pega bem.

Mas aí, a gente chega no Ethan Hawke.

Que no caso, é o protagonista do filme “novo” do Nick Hornby. Entre aspas porque já tem um tempo, passou batido e eu confesso que sei da existência desse filme há um tempo, mas adiava... adiei tanto que já tem outro filme, cujo livro sequer foi traduzido!

Porque eu lembro de não ter gostado muito de “Juliet, Naked”, quando eu li - mas acho que o período em que foi lido não era o mais legal da minha vida, então eu nem lembrava direito algumas coisas...

Mas o Ethan Hawke...

Vamos falar um pouco sobre o Ethan Hawke.

Eu vi Sociedade dos Poetas Mortos com 17 anos, a idade daqueles meninos.

E eu mais do que VI o filme, eu incorporei o filme e por favor, quem não foi dado a esses arroubos aos 17 anos?

E aí, em “Antes do Amanhecer”, eu tava com aquele mesmo cabelinho e eu sei que eu não me pareço com ele, mas “as pessoas” diziam isso. Eu tava magrão, nadando abaixo de 47...

Em “Antes do Por do Sol” tem a coisa de ir lançar livro em Paris e a moça aparece... e “alguém vai perder o avião...”

Eu vi “Antes da Meia Noite” numa quase anestesia que tinha sido tipo o passo adiante do astral desse filme, mas tem AQUELE diálogo, quando ele fala:

“Louca? Se eu acho que você é louca? Acho que você é a prefeita do vilarejo da loucura”.

E eu sei que não se deve e eu não chamo mulher nenhuma de louca, mas a frase é legal.

O nome do meio do Ethan Hawke é... Randall.

Apenas coincidências, nada mais.

Aí tá lá o Ethan Hawke no filme baseado no livro do Nick Hornby, pós infarto e começa a chegar filho e ex-mulher dele e a moça que ele tá meio a fim e se correspondendo por e-mail, vendo aquilo tudo...

E acho que em algum momento, as pessoas "se dão conta". Olham ao redor e pensam... "caralho, eu vou dar conta disso?".

Porque viver mais de 40 anos faz a gente ir acumulando tralha e acho que um dos mini-segredos da boa convivência é a capacidade da gente esconder as nossas tralhas... na medida em que não dá pra jogar fora, mas o ato de esconder a nossa tralha, nos dá um traço de "normalidade"...

Que é como em Febre de Bola, quando o Colin Firth se levanta da cama e veste uma cueca do Arsenal, a namorada pergunta o que era aquilo?

"Minha cueca do Arsenal..."

"Eu sei, mas... você acha normal usar isso na frente de uma outra pessoa?"

Tem um livro que eu li faz uns dez anos, acho sensacional. Inclusive, o título deveria ser um mantra: "O que te trouxe até aqui, não vai te fazer chegar lá".

O "lá", no caso, é no sentido de "mais adiante".

Pra mim, deveria ser escrito um, onde o "lá" é meio que pro outro lado. Ou com 90 graus de curva, talvez.

Talvez, botar fogo nas cuecas do Arsenal ou criar rituais com cuecas maneiras para quando estiver na frente de outras pessoas.

Em qual veículo você está viajando? Ele tá com a manutenção em dia? Tem seguro? Colocou gasolina o suficiente?

Antes de abrir a porta para outra pessoa entrar, você pelo menos está com a sua CNH em dia?

Esse carro te trouxe até aqui, sim.

Mas larga ele aí na estrada e vem voltando... tipo o carinha que virava Hulk na Sessão Aventura, no final do episódio, vem voltando, caminhando, sozinho, música triste tocando, vai pensando na vida.

Não interessa que tipo de raio gama a que você foi exposto e vira essa coisa verde que é um caminhão de coca-cola descendo a ladeira sem freio...

Onde é o seu "lá"?

Prepara a viagem, se organiza, bota tudo em ordem e vai.

Sozinho, você aproveita a paisagem.

Acompanhado, tem alguém com quem conversar.

Mas a viagem é sua e essa trajetória é só com você.

E para de ficar visualizando o Ethan Hawke fazendo essa viagem!