Esses dias teve a comemoração de 100 anos da festa de São Pedro Pescador, a mais tradicional daqui de Ubatuba. O encerramento foi com um show do Renato Teixeira — que eu não sabia, mas é de origem ubatubense, como ele fala nessa entrevista gostosa na rádio Costa Azul. Confesso que, por ignorância, fui lá na festa só pra tomar um quentão e dar um close, mas acabei sendo possuído pelo show. O Renato tocou várias parcerias que ele tem com o Almir Sater, que são, basicamente, todas as modas de sucesso da novela Pantanal. | ||
Cheguei em casa com vontade de ouvir mais, e me senti ultrajado quando lembrei que não tinha assistido ao último capítulo de Pantanal, apesar de ter acompanhado a novela inteira. Inclusive, a trilha sonora da cena que procede a morte do Seu Zé Leôncio é "Assim os Dias Passarão", uma música que arde o coração de tão bonita, e que me fez ser mais fã do Renato Teixeira. | ||
Eles terminam esse capítulo final com a voz do próprio Benedito Ruy Barbosa, autor da versão original, falando: | ||
O homem é o único animal que cospe na água que bebe. O homem é o único animal que mata para não comer. O homem é o único animal que derruba a árvore que lhe dá sombra e frutos. Por isso, está se condenando à morte. | ||
Achei curioso porque é a mesma mensagem do único livro que comprei agora n'a feira do livro, da 451, "A terra dá, a terra quer", do pensador quilombola Nego Bispo. Tem um trecho que ele diz assim: | ||
A humanidade é contra o envolvimento, é contra vivermos envolvidos com as árvores, com a terra, com as matas. Desenvolvimento é sinônimo de desconectar, tirar do cosmo, quebrar a originalidade. (...) Relacionar-se de forma original, para o eurocristão, é pecado. Eles tentam humanizar e tornar sintético tudo o que é original.” | ||
Acho bonito como ele sequestra o sentido das palavras o tempo todo. Nesse trecho, ele usa o termo "humanizar" não como sinônimo de "tornar humano" (algo bom), mas como "antropocentrizar" (algo ruim), tipo como se fosse uma padronização do Universo tendo o ser humano como régua, o que, além de arrogante, é meio imbecil. É uma ânsia colonizadora que, quando eu vejo sendo defendida por gente da América Latina em 2023, só me faz pensar no Paulo Gustavo falando "ohhh bicha, tadinha". | ||
O livro mostra que é possível pensar numa forma de vida na qual você não tenha sua alma sugada pelo Grande Cu do Capitalismo. Mas, ao expôr essas ideias, a gente percebe como o ser humano é idiota mesmo e que não é impossível que a humanidade se autodestrua em algum momento, dado o tanto de urubu que defende o Marco Temporal, por exemplo. | ||
Enfim, não sei se o mundo vai acabar pelas nossas próprias mãos ou não, mas, enquanto isso, eu enfeito esse cenário horroroso com as músicas bonitas do Renato Teixeira. | ||
O que eu andei lendo: | ||
😬 A viúva de Gal Costa, do Thallys Braga, na piauí. Muito chato descobrir que uma das maiores vozes do Brasil tava presa num relacionamento abusivo com uma trambiqueira escrota. Esse texto é assustador em cada linha. (Me avisa se não conseguir acessar pelo site.) | ||
😁 Decolonizando o protagonismo do techno, na newsletter Fritness, da Vivian Caccuri. A fluidez da música eletrôncia árabe contra a rigidez metálica do techno convencional. | ||
🧐 A trama da Meta, na newsletter Plataforma, do Alexandre Aragão. O Ale é o amigo pra quem eu recorro quando quero saber alguma coisa difícil de política ou tecnologia ou músicas psicodélicas. Além de pai de gato, ele também é editor-executivo do Aos Fatos, e acabou de estrear essa newsletter ótima pra facilitar minha vida. | ||
🤖 Realidade Virtual na terapia psicodélica: amiga ou inimiga?, no Ciência Psicodélica. Tive o prazer de editar esse texto que o Bruno de Pauw escreveu pro CP. O Bruno é o criador do podcast Relatos Psicodélicos e, nesse artigo, ele mostra que já tem gente pensando em fazer tratamentos psicodélicos com tecnologia futurista. | ||
🙃 Saiba qual é a relação de psicodélicos com a luta por direitos da comunidade LGBTQIA+, do Marcelo Leite, na Folha. A gente esquece que os psicodélicos foram usados em terapias de conversão, a famosa "cura gay", e é preciso falar muito no assunto — aliááás, fiz uma live sobre esse tema com a antropóloga Lígia Platero, e acho que nem comentei aqui. | ||
🫢 Alianza Impensada: Usaron Ayahuasca en la Búsqueda de los Niños Perdidos en la Selva de Colombia, no El Planteo. Gente, e essa história das crianças perdidas na floresta... "A Guarda Indígena tem capacidade organizacional, cultural e espiritual. O Exército tinha capacidade técnica e operacional, com seus navios. A combinação nos permitiu chegar ao ponto em que as crianças estavam.” | ||
🙃 The Psychedelic Scientist Who Sends Brains Back to Childhood, da Rachel Nuwer, na Wired. Artigo muito foda explicando como foi feita a pesquisa que mostra de que forma os psicodélicos reabrem "jenelas de aprendizado" da infância. (Resumi essa história aqui no Ciência Psicodélica). Fiquei encantado pela forma como a jornalista Rachel Nuwer escreve, até mandei mensagem pra ela no instagram, e descobri, lendo essa entrevista do Inverse, que ela tem um livro sobre MDMA que se chama "I Feel Love" (melhor título inspirado na Donna Summer!). Ansioso pra ler. | ||
🤓 Cultura estelar Tupi-Guarani. A ilustradora Maybí Machacalis ilustrou um livro de astronomia tupi, mostrando que a observação dos céus não é uma exclusividade da ciência ocidental. Nesse desenho, por exemplo, a Maybí mostra a constelação Joykexo, que corresponde ao Cinturão de Órion, ou as Três Marias. Ela fez uma thread linda no twitter. | ||
Cantinho da autopromoção | ||
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O que eu andei vendo: | ||
VÍDEO: Black to techno, uma parceria Frieze & Gucci. Nem sou tão fã de música eletrônica assim, mas, depois de ler a newsletter da Vivian Caccuri, que indiquei aí em cima, fiquei muito curioso pra ver esse mini-doc (em inglês) sobre o surgimento do techno em Detroit. | ||
VÍDEO: Reinaldo Azevedo entrevista Erika Hilton, no DiaCast. Poderia ser horrível, mas foi uma conversa muito esclarecedora sobre gênero, política, religião e família. | ||
FILME: Era uma vez um gênio, no Prime Video. Filme mágico, bonito e filosófico com os maravilhosos Idris Elba e Tilda Swinton. | ||
SÉRIE: Os outros, na GloboPlay. Essa série só escala e vai ficando tudo pior. Amei. | ||
REALITY: Casamento às Cegas, da Netflix. Eu amo ver a ascensão e a queda da paixão hétera de forma tão bem resumida. | ||
O que eu andei ouvindo: | ||
ÁLBUM: Crônicas da Cidade Cinza, do Ogi. Entrevistei o Ogi pra Playboy em 2011, quando ele lançou esse álbum. E aí eu me toquei que fazia ~doze anos~ que eu não escutava essa preciosidade. | ||
ÁLBUM: Letrux como Mulher Girafa, da Letrux. Fui tragado por esse disco lançado agora e não consigo mais sair dele. | ||
PODCAST: Por trás do disco #38, Letrux como Mulher Girafa, no Vamos Falar Sobre Música? Pra você ver como eu quis destrinchar o álbum. | ||
PODCAST: Maconha, entre a proibição e o hype, no Ciência Suja. Eu na estrada com meus pais, indo para Paraty, escutando sobre a legalização da maconha. | ||
PODCAST: Nenê da Brasilândia, da Wondery. Reportagem excelente sobre a maior traficante que São Paulo já teve. Daquelas que ajudam a gente a entender a cidade e o Brasil. | ||
PODCAST: Inventando as Regras, do Rádio Novelo Apresenta. Eu sou completamente apaixonado pelos episódios do RNA. Nesse, o Rafael Revadam conta como transformar linguagem matemática em libras. | ||
PLAYLIST: Lakshmi e os ciganos. A playlist do último ritual de ayahuasca que participei aqui em Ubatuba é de chorar e de dançar. | ||
A PunkYoga é uma newsletter quinzenal, que sai sempre às sextas-feiras (pelo menos, esse é o cronograma que tá na minha cabeça). Então, daqui a quinze dias, eu volto com a edição regular, aquela em que eu escrevo um texto pretensioso sobre alguma brisa cósmica. | ||
Obrigado pelo seu tempo! Se quiser trocar uma ideia, comentar alguma indicação, me mandar um pix de 5 mil reais ou pedir texto de link com paywall, é só me responder aqui ou me achar lá no instagram. | ||
Vai pela sombra e fica na paz de Bowie. | ||
Com amor y anarquia, | ||
Nathan | ||
Se você chegou aqui através de um link, deve tá pensando: "Como eu assino essa newsletter maneira?". Ora, é só deixar seu e-mail aqui. E dá pra ler as edições anteriores aqui também. Se não curtiu e tá aqui lendo esta última linha, admiro sua capacidade de autoflagelação. | ||