PunkYoga #14 Tsunami de São Miguel, Parte I

"Tudo o que você tem é o que você é, e o que você dá"

Nesse mês, eu resolvi fazer a dieta de São Miguel. Não tem nada a ver com dieta, na verdade, tô zuando. Mas é parecido, porque, durante 21 dias, você precisa escutar a oração de São Miguel na hora em que for melhor pra você. 

O áudio que eu tava ouvindo era esse aqui. 

Eu sou zero católico. Inclusive, é difícil não ter ranço da Igreja Católica depois que você começa a entender o mundo, né. Podia citar a Inquisição, os casos de pedofilia ou a ostentação ridícula, mas chamo atenção para essa artimanha satânica que eles têm de entrar na mente das pessoas e implantar ali uma culpa que, muito provavelmente, vai te comer vivo. Isso é nojento.

E eu fiz primeira comunhão, fiz crisma, minha avó rezava missa quando o padre faltava e até já cogitei ser padre na infância. Mas aí virei ateu anarquista júnior no colégio e o resto eu tô contando aqui aos poucos. 

Então, pra mim, foi muito difícil me desvincular das garras do Papa e começar a ter um pensamento próprio. Não por imposição da família, graças a Jah, porque meus pais são muito good vibes, eles nunca ligaram para o que eu acredito desde que não usasse drogas e nem entrasse em coma alcoólico (o que eventualmente acabou acontecendo, longa história...).

A dificuldade tava mais por conta da minha mente mesmo. Esse sentimento de culpa, que, como falei, a Igreja implanta na nossa cabeça como se fosse um chip. 

Precisei de alguma maturidade para entender que o que eu entendia por cristianismo não tinha nada a ver com a Igreja. A Igreja é um instrumento de controle, é um prédio erguido por homens tão falhos e gananciosos quanto eu e você. Mas, curiosamente, assim como o budismo, o induísmo, o islamismo, o candomblé... o cristianismo também tem uma essência que é baseada em cura e amor. 

Basicamente, a instituição católica e a espiritualidade católica são coisas bem diferentes. Entender isso foi necessário pra que eu pudesse fazer as pazes com o meu passado, e, no fundo, comigo mesmo né. 

Esse entendimento rolou em um ritual de ayahuasca que foi direcionado a São Miguel, ou seja, com uma vibe mais católica. Isso me assustou no início, mas durou só até a hora de começar a invocação de São Miguel, que lá pelo meio diz o seguinte:

Ó Príncipe celeste, pelo Divino poder afastai de mim tudo o que não me faz bem São Miguel em cima , São Miguel em baixo São Miguel à esquerda, São Miguel à direita São Miguel à frente, São Miguel atrás  São Miguel, São Miguel, São Miguel  Aonde quer que eu vá

Isso é repetido algumas vezes. Achei bem poderoso, porque na hora que começou a invocar esse tanto de sãos-miguel eu fui me sentindo muito protegido. É como se uma muralha de ferro invisível se erguesse ao meu redor e eu não tivesse mais medo de nada. Imagina uma legião de anjo poderoso pra caralho empunhando espadas e dizendo "sem tempo, irmão" pra tudo aquilo que te prejudica na vida. 

Depois disso, a invocação segue com:

                             Eu sou o seu amor que me protege aqui.

Isso também é repetido algumas vezes. Talvez até fixar na cabeça. E me parece algo interessante a ser fixado porque a primeira coisa que me chama atenção aqui é a construção desse frase: EU sou o SEU amor que ME protege aqui. 

Se eu sou amor e eu mesmo me protejo, quer dizer que tudo que eu preciso está dentro de mim. Logo, eu sou o meu próprio anjo, eu sou o meu próprio deus. É um raciocínio completamente diferente daquele que coloca Deus como uma entidade superior a qual você precisa lutar para agradar, caso contrário ele te manda pro inferno e você que se foda. 

Teve muito mais coisa, mas resumindo: senti mesmo um troço poderoso, venci algumas barreiras minhas e acho que consegui chegar na essência de uma religião encoberta por lama. Afinal, se sentir amado e protegido é tudo que a gente quer, né. Ainda mais quando esse amor e essa proteção vem da gente mesmo, com a consciência expandida pelo DMT... amada kkk

Me lembrei que a única oração católica que eu faço até hoje é uma que minha avô me ensinou, a do anjo da guarda: "Santo anjo do senhor/ meu zeloso guardador/ se a ti me confiou/ a piedade divina/ sempre me rege/ me guarda/ me governa/ me ilumina/ amém.

"E aí eu me toquei que na real eu sempre tive essa ligação forte com a ideia de um anjo protetor. E pensando bem isso é muito reconfortante. 

Por isso que quando algumas amigas me falaram sobre essa oração de São Miguel, que deve ser feita durante 21 dias, eu achei que deveria ver qual é. E eu vi. Algumas coisas interessantes aconteceram.

Mas acho melhor contar só na semana que vem, porque se vocês quisessem ler um Guerra e Paz pelo celular não teriam acessado esse e-mail, afinal... Até sexta que vem =]

O que eu tô ouvindo:

Na trilha sonora da série Pose tem uma música que eu nem tinha prestado atenção até a Pasqui comentar dela. É Running Up That Hill, da Kate Bush. Reconheço que não conhecia absolutamente nada da Kate Bush, sem ser aquela Wuthering Heights, que tem uma pegada meio Tetê Spinola, que nunca me comoveu. 

Daí que eu sigo uma conta gringa no instagram que se chamaNick Cave and the Bad Memes, que é bastante engraçada se você curte Nick Cave, David Lynch e pós-punk deprê dos anos 80. Então, numa daquelas perguntas dos stories, alguém quis saber se o criador da conta curtia mais Morrissey ou Ian Curtis, e ele respondeu Kate Bush.   

Isso me deixou bem chokita porque foi ai que eu percebi que nunca parei pra escutar Kate Bush, eu sequer me interessei por isso. E o pior: só reparei porque um cara colocou o nome dela ao lado de dois ícones do meu triste coração. Será machismo? Será que fui criado numa sociedade patriarcal que valoriza o intelecto masculino e tenta apagar qualquer vestígio de inteligência feminina? Hummm...

Seja como for, eu resolvi parar pra escutar essa mulher e eu tô simplesmente abismado por ter sido tão relapso a minha vida toda. Ainda tô recuperando o tempo perdido aqui, tem muita coisa pra escutar, mas esses sintetizadores chorosos me impactam tanto que eu já derreti faz tempo. Já não sei se posso mais viver sem ouvir Cloudbusting balançando o pescoço à moda do Fat Family. 

O oráculo do Bowie, um conselho pra semana:

Fiquei impactado com a simetria da carta doStarman Tarotque traz a A Imperatriz. E também com a semelhança dela com a Shakira. Mas, enfim, me trouxe uma ideia de equilíbrio bem forte.

Aí fui ler sobre ela e descobri que, segundo o Angelis, a Imperatriz representa o arquétipo da mãe, e com ela o da Mãe Natureza. Ela entende os ciclos da vida, entende que tudo que nasce precisa morrer. E, se ela aceita alegria, amor e felicidade, também aceita dor, perda e tristeza na mesma medida.

Antes de tirar a carta, eu tava ouvindo um ponto de Iemanjá que diz o seguinte:

                            Segura, marinheiro! O balanço do mar tá te ensinando a navegar

Acho que é isso. Aceitar que as tormentas também fazem parte da existência, e sobreviver a elas porque depois da agitação o mar só pode ficar calmo. Nenhum maremoto dura pra sempre. Como numa espiral, as coisas se transformam. Você se transforma. O Angelis diz ainda:

Uma gaiola dourada flutua acima da cabeça da Imperatriz sugerindo que, apesar das aparências, a porta da liberdade está sempre aberta — todos podemos ser livres como pássaros.

Com o tempo, a experiência, toda essa transformação e aprendizado, acho legal refletir sobre se quem prende a gente na gaiola é uma outra pessoa ou a gente mesmo.

Eu sempre dizia que eu tinha dislexia conveniente. Era uma desculpa que eu usava toda vez quando errava alguma coisa num texto, tipo uma grafia, uma concordância, errinhos bobos de falta de revisão. E eu costumo errar bastante. 

Isso ficou bem sério quando eu virei editor digital da Galileu, passei a ser responsável pela revisão dos textos, e várias matérias do site saíam com erros. Fui no médico pra ver se eu tinha dislexia mesmo, e não deu nada. 

Mas eu sigo nessa luta de tentar encontrar errinhos nas coisas que escrevo. Outro dia publiquei uma edição da news com um "Paráboloa do Semeador" no título, cês viram? É esse tipo de coisa. 

O fato é que, como vocês devem saber, é difícil pegar erros no seu próprio texto quando você tá imerso nele por algumas horas. E eu não tenho ninguém pra revisar. Faço meu melhor, mas se vocês acharem umas aberrações gramaticais por aí, me avisem, por favor. 

E, claro, tô sempre disposto a falar mais sobre essas coisas que eu escrevo aqui, sobre como a novela das 9 é horrível (mas não consigo parar de ver) ou sobre fofocas de famosos. Só responder esse e-mail ou chegar lá no Insta e no Twitter.

Vai pela sombra e fica na paz de Bowie.

Com amor,

Nathan

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