O Brasil é um país infantil
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O Brasil é um país infantil

(Essa frase não é minha, é da minha esposa.)

Rafael Spínola
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(Essa frase não é minha, é da minha esposa.)

De todos os animais, os filhotes de ser humano são os que mais dependem dos adultos, já que levam quase um ano para aprenderem a andar, e mais uns tantos para se educarem e serem capazes, legal e psicologicamente, de se tornarem responsáveis por seus atos. Uma frase clássica das crianças é o "mãe, vem me limpar" quando começam a fazer o número dois por conta própria.

Essa exata frase parece fazer muito sentido no contexto brasileiro. Parece que uma parcela significativa da população quer sempre ter alguém ou alguma maneira de se eximir das suas responsabilidades individuais. E existem dois caminhos para esse comportamento se desenrolar: a impunidade e a preguiça.

A impunidade se manifesta por exemplo nos crimes de trânsito. É raro ver algum tipo de condenação séria para quem mata ao dirigir. É comum ser algumas cestas básicas e a suspensão da carteira de motorista, isso depois de longos e longos anos de julgamentos e recursos.

O caminho da preguiça se mostra por exemplo nas discussões sobre aposentadoria. Devido à falta de educação financeira de muita gente, o INSS descontado na fonte se torna "uma dor de cabeça a menos" para os trabalhadores. Ao final da vida de trabalho, esse montante acumulado rende muito pouco e gera problemas como uma renda insuficiente para custear a rotina dos aposentados.

(Sim, eu sei que o INSS não é só aposentadoria, e sei que a educação financeira não é fornecida, constituindo portanto mais um exemplo do comportamento que transfere para o outro a responsabilidade, esperando que essa educação venha.)

Para propor uma alternativa: em Portugal, se você está dirigindo e é parado pela polícia, você precisa mostrar três documentos. O do veículo, a sua carteira de motorista, e o comprovante da apólice de seguro particular. Todos os carros devem ter seguro, e não existe equivalente ao DPVAT lá. As pessoas tem liberdade de escolher que seguro contratar, sem falar na necessidade de pagar duas vezes. Nesta mesma linha, o governo poderia colocar como regra que toda instituição financeira que quer operar previdência privada no Brasil deva oferecer uma aplicação 100% sem risco e sem tarifas, em substituição ao INSS. Se o funcionário quiser uma opção alternativa de investimentos, que possa escolher e eventualmente pagar por essa gestão. E para o empregador, o depósito nessa conta indicada seria reconhecida como quitação de suas obrigações trabalhistas.

Infelizmente, ao comparar essas análises com o que realmente acontece, fica uma impressão de que muita gente prefere fazer o que lhe dá na telha, sem planejamento e sem pensar nas consequências para si e para os outros, porque depois sempre haverá o jeitinho de consertar as coisas. Ah, de preferência gratuito, porque é obrigação constitucional, por exemplo.

Por fim, os enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de serviços gerais dos hospitais, médicos e todos os profissionais da saúde. Esses sim estão assumindo a responsabilidade de muita gente que não tem nenhuma. Mesmo sem ser da área, mal consigo imaginar o quão frustrante deve ser para eles a morte de um paciente. Ainda mais as mortes evitáveis.

Em resumo: muitos brasileiros querem que alguém assuma suas responsabilidades, comportamento estimulado pela impunidade e pela preguiça, e consequentemente querem fazer o que lhes dá na telha de forma inconsequente.