Diego, o ídolo que não posso ter
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Diego, o ídolo que não posso ter

Todo fã de futebol argentino deveria ter, por princípio básico, o pavor de simpatizar com eles. A lição número um de um argentino é o amor ao seu, rivalidade em alta e nenhuma simpatia pelo "inimigo".

Rica Perrone
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Todo fã de futebol argentino deveria ter, por princípio básico, o pavor de simpatizar com eles. A lição número um de um argentino é o amor ao seu, rivalidade em alta e nenhuma simpatia pelo "inimigo".

Então, meu caro, se gostas deles, nada aprendeu com eles.

Eu odeio o Maradona. 

Mas odeio por diversos motivos. O menor deles é pela guerra dele contra a imprensa, já que a vida como jornalista me ensinou que em 90% dos casos a imprensa está mais errada do que qualquer inimigo dela. 

Assisti a brilhante série do Prime Video sobre Diego. E de fato, como acontece com todo "vilão", quando a história contada envolve os porques e o lado pessoal você simpatiza. Acontece até com Escobar, porque não com Diego?

O fato é que trata-se de um brilhante e talentoso imbecil. Mas ainda assim, brilhante.

Toda pessoa que destrói a própria vida, família e tudo que está a sua volta não pode ser referência. E mesmo que a gente tente separar, não rola. Diego era exatamente a mesma pessoa fora de campo e dentro dele.

Se jogasse no Brasil, em qualquer clube, seria meu ídolo. 

Simples assim. 

Diego erra, faz loucuras, idiotices, mas não caga regra. Assume os erros, não se faz de santo moralista, e mesmo numa cama fodido, se enxerga. 

Eu adoro gente que erra. 

Diego tem tudo pra ser um ídolo. E eu compreendo com facilidade porque a Argentina o ama. Mais do que Copa, gols, há dois gols que vingam uma guerra. E isso ninguém vai entender analisando futebol. 

Mas eu estou do outro lado. Eu sou vítima do Diego. Da sua cafajestagem, do seu mau caratismo desportivo e de sua qualidade técnica. Portanto, não posso me dar o direito de ser tão pequeno ao ponto de ama-lo. 

No máximo, talvez, reconhecer que sua figura é única. Infinitamente menor que Pelé, em campo e fora dele, e ainda assim divide jornalistas brasileiros na questão da idolatria, o que explica muito mais sobre nossa imprensa do que sobre Diego. 

A série é necessária. Todo grande nome deveria ter uma série pra explicar como, porque e o que ninguém sabe por trás de cada julgamento público. 

Maradona foi vítima de uma imprensa surreal na argentina. Mas também mereceu, por ser o maior vilão de si mesmo. 

Eu terminei a série rindo porque o título da Argentina de 86 tem de tudo, menos tática, bom trabalho e planejamento. Já nossas derrotas sempre passam pela CBF, pelo treinador, pelo "projeto". 

De fato, só ouvimos um lado no futebol:  Ganhou, foi bom. Perdeu, foi uma tragédia. 

Maradona é tão argentino que ele lambe as botas do Pelé até ganhar notoriedade. Desde então ele passa pisotear no ídolo. Normal. É deles.

E nossa cara é achar bonito, porque ao contrário deles, não temos um pingo de vergonha na cara.

Eu sempre digo que a melhor coisa que aprendi com argentinos foi a odia-los. Exatamente por isso. O que eles tem de melhor é a auto-estima, o valor dado aos deles, a ostentação da rivalidade mesmo que no grito, e a certeza de serem algo que não chegam perto de ser.

Diego chegava perto. Mas ele mesmo se desarmava. O seu melhor marcador foi ele mesmo. 

E com toda simpatia que tenho por figuras como Romário, Edmundo, Djalminha, Neymar e tantos outros que simplesmente cagam pro que esperam dele e faz apenas o que ele quer, Diego me ensinou duas coisas: Que nem todo gênio é inteligente. E que nem toda inteligência do mundo te faz genial.

RicaPerrone

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