Posso te chamar de "mô"?
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Posso te chamar de "mô"?

Eu amo uma camisa.  Ela é amarela, comum, todo mundo tem. Mas não há nenhuma mais especial.  Algumas pessoas tentam comparar o amor pelo clube e pela seleção. Mas é quase uma tentativa  boba de atrelar nossa paixão a algo tão superior que nem faz s

Rica Perrone
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Eu amo uma camisa. 

Ela é amarela, comum, todo mundo tem. Mas não há nenhuma mais especial. 

Algumas pessoas tentam comparar o amor pelo clube e pela seleção. Mas é quase uma tentativa  boba de atrelar nossa paixão a algo tão superior que nem faz sentido. 

A seleção brasileira é a porra toda. 

Nós não sofremos por ela o ano todo. Não somos zoados quando perde. Não moramos ao lado do rival. E assim dela só cobramos. Nunca a defendemos. 

Mas trata-se, goste ou não, do nosso passaporte. 

O mundo vê um brasileiro sempre de amarelo. O mundo olha pra nós e imagina uma bola. O mundo sabe quem somos. E somos o futebol. 

Quando esse time perde uma Copa eu prometo pra mim mesmo que na próxima será diferente. Que vou sofrer menos, que vou acreditar menos e entender uma nova derrota com mais maturidade.

E passam 4 anos lá estou eu de novo com as mãos suadas vestido de amarelo esperando a bola rolar como aquele garotinho de 7 anos que rezava pelo joelho do Zico em 86. 

Um marmanjo profissional de comunicação com 25 anos de carreira que quando pensa já ter perdido o fator passional da coisa se vê gritando com o zagueiro da Sérvia em frente a tv. 

Todos os meus problemas sumiram hoje as 17h35. Meu problema agora é o tornozelo do Neymar. 

Eu sofri. Tô sofrendo. E adorando sofrer. 

Pós graduação de jornalista esportivo é retornar de tempos em tempos pra condição de torcedor pra se lembrar com quem tá falando e sobre o que. A seleção me dá isso.

Eu posso odiar um rival. Posso perder a razão, torcer contra, juntar gente e falar do "nosso time" sem ter que saber pra quem ele torce. Porque ele torce pro Brasil é óbvio. 

Eu não tenho nenhum amigo que torce contra a seleção. Não ando com idiotas.

Entre acertar um palpite e ganhar a Copa, ou você escolhe a Copa ou você é um imbecil sem precedentes. 

Entre o tornozelo do Neymar e o dólar, amanhã você só pode acordar e olhar primeiro o dólar se for maluco. 

Eu adoro olhar em volta na Copa e ver aquele monte de gente que não ama futebol sendo vistos como estranhos e não nós, doentes por ele o tempo todo.

Voces de 4 em 4 nos temos a chance de nos entender. E nós que passamos a vida sem entender vocês?

A seleção tem o dom de me despir. Eu não sei fazer tipo, fingir indiferença ou ser imparcial. Não controle meu ímpeto, não sei raciocinar contra argentinos, nem esconder meu medo de frustração. 

Fico vulnerável como uma paixão. E eu adoro me apaixonar. Mas acho que quando dura 44 anos já dá pra chamar de amor, né?