O FRACASSO BILIONÁRIO DE BUFFETT E LEMANN
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O FRACASSO BILIONÁRIO DE BUFFETT E LEMANN

Imagine reunir uma série de bilionários em torno de um mesmo negócio.

Rodrigo Felicissimo
9 min
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Imagine reunir uma série de bilionários em torno de um mesmo negócio.

Imagine que dentre eles estão o maior investidor do mundo Warren Buffett e o homem mais rico do Brasil, Jorge Paulo Lemann.

Imagine agora que eles traçaram um plano para conquistarem o mercado de alimentos em todo o mundo....

Bom.... isso aconteceu.... só que não do jeito que foi planejado...

Essa foi a saga da Kraft-Heinz, a gigante dos alimentos que prometeu conquistar o mercado, mas que ainda está longe disso... e que agora luta para continuar de pé...

Considerada como um fracasso bilionário de Lemann e Buffett, a Kraft Heinz surgiu de um ousado plano de concorrer com gigantes do mercado de alimentos como Pepsico e Unilever.

O primeiro movimento surgiu quando o maior investidor do mundo se juntou com os brasileiros do grupo 3G Capital – a reunião dos bilionários brasileiros Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira, Marcel Telles e Alexandre Behring.

Reunidos eles compraram a Heinz, tradicional empresa americana que dominava o mercado internacional de molhos e enlatados, e que é responsável pelo ketchup mais famoso do mundo. Cujo a história já foi contada em nosso canal.

A operação feita em 2013, custou cerca de 20 bilhões de dólares.

Porém, assim como décadas antes o Grupo 3G conseguiu transformar a cervejaria Brahma no embrião do que hoje é o grupo AB INBEV, a maior cervejaria do planeta; havia o objetivo entre os bilionários de usar a Heinz para dar início a um colosso alimentício.

Dessa forma, assim como na década de 90, eles uniram a Brahma e Antártica; em 2015, eles decidiram dar início a uma ousada operação de fusão para contarem com a também americana Kraft, responsável por uma série de produtos alimentícios, dentre eles uma famosa linha de queijos processados com o mesmo nome.

A operação movimentou 10 bilhões de dólares, que saíram dos bolsos dos sócios. E deu origem à Kraft-Heinz, uma empresa avaliada em 48 bilhões de dólares na época, com mais de 200 marcas e disponível em quase 200 países.

Além das já citadas, o conglomerado também conta com marcas conhecidas como os sucos Tang e o queijo cremoso Filadélfia.

E pouco tempo antes da fusão, a Heinz já havia comprado a Quero, empresa brasileira de molhos e enlatados.

No momento da fusão, a Kraft Heinz se tornou a 3ª maior marca do setor americano de alimentos e a 5ª maior do mundo no setor.

A partir daí, a operação passou a ser tocada pelo grupo 3G, que decidiu implementar o mesmo modelo de gestão que já havia sido aplicada em outras empresas administradas por eles, como a AMBEV e a rede Burger King.

Com uma mentalidade considerada espartana, o grupo instituiu o chamado Orçamento Base Zero, que visa um intenso corte de custos e um planejamento com base na otimização dos recursos.

Dessa maneira, a fusão das empresas tinha como objetivo não só consolidar uma grande fatia do mercado, mas também criar uma sinergia; de modo que a junção das empresas daria origem a um conglomerado mais rápido, enxuto e claro, mais lucrativo.

Com esse objetivo, foram escalados alguns membros de confiança do grupo brasileiro como Bernardo Hees e Alex Behring.

E nos primeiros anos, a metodologia 3G foi aplicada à risca, com a eliminação de uma série de custos considerados desnecessários e também com um grande número de demissões; uma vez que se entendia que com a fusão das empresas, era possível fazer o mesmo trabalho ou até mais, com uma quantidade menor de empregados.

Uma estratégia que a princípio deu resultado e se mostrou acertada, a ponto de o grupo anunciar um passo extremamente ousado – uma oferta agressiva para a compra da Unilever em 2017.

A oferta de incríveis 143 bilhões de dólares planejava criar uma gigante do mercado alimentício, a exemplo do que havia sido feito nos anos 2000 quando a AMBEV se juntou à belga Interbrew, formando a INBEV; que por sua vez comprou a americana Anheuser Busch, dona da Budweiser, formando a AB Inbev.

Entretanto, apesar do valor substancial, a Unilever rejeitou o acordo, uma vez que segundo ela – a oferta não traria benefícios a empresa e nem a seus acionistas.

E a negativa deu abertura para uma série de notícias desastrosas para a gigante... que de uma estrela potencial passou a uma empresa sob dúvidas e em sérias dificuldades.

Primeiro, enquanto se preocupava exclusivamente em cortar custos e adquirir empresas semelhantes, a Kraft Heinz se preocupou mais consigo mesma do que com as necessidades e reações do mercado consumidor.

Enquanto apostou em aumentar a lucratividade de seus próprios produtos, a empresa deixou espaço para que as concorrentes conquistassem outros nichos de mercado que a empresa não estava enxergando – como alimentos mais saudáveis e opções de nicho sustentáveis, como produtos veganos, por exemplo.

Conquista dos concorrentes que aconteceu tanto pela inclusão de novos produtos e marcas, tanto pela aquisição de empresas menores e inovadoras.

Em paralelo, mesmo cortando custos, as marcas e produtos do grupo não possuem alto valor agregado, e estão em constante batalha de preços com as concorrentes.

Para completar, seus produtos são de fácil reprodução por parte dos concorrentes, o que abriu espaço, por exemplo, para marcas genéricas e até mesmo as marcas in house, que são aquelas com bandeiras dos supermercados... os mesmos que também vendem os produtos da Kraft Heinz.

O que permitiu com que na prática, as pessoas possam encontrar, por exemplo, queijos processados com a marca do supermercado, com qualidade muito semelhante ou idêntica à dos produtos da gigante, por um preço menor. O que imediatamente tira clientes da gigantes.

Isso, porque, as marcas da casa ou genéricas se preocupam mais em ganhar com o volume de produtos vendidos do que com a pequena margem gerada pelo prestígio e a fama das grandes marcas. O que muitas vezes obriga as marcas a reduzirem ainda mais suas já apertadas margens.

Nessa batalha, grande parte dos consumidores mundo afora passou a optar pelas alternativas em relação aos produtos de marca, especialmente da Kraft-Heinz; um movimento que prejudicou e muito a gigante, que não tem para onde ir dentro destes mercados -a não ser descer para a briga de preços.

E além de sofrer com a queda nas vendas, a gigante até então não conseguiu colocar no mercado outros produtos que lhe concedessem destaque no mundo dos alimentos.

Dessa maneira, do ponto de vista do mercado, a Kraft Heinz rapidamente começou a perder vendas e espaço de mercado. Um movimento que está a prejudicando muito nos últimos anos.

Para complicar ainda mais, as contas da empresa foram colocadas sob suspeita. O que rendeu uma investigação das autoridades americanas sob suposta fraude contábil.

Denúncia que mostrou que havia sim um erro grave nos números da gigante, entre 2015 e 2018, que indicavam custos mais baixos do que realmente eram; e que assim resultavam em lucros contábeis maiores do que a empresa realmente tinha.

O que rendeu uma multa de 62 milhões de dólares e uma correção no balanço da empresa, anunciados em 2019.

A operação foi encarada pelo mercado como um escândalo e derreteu o valor das ações da empresa. O que fez com que o então CEO da empresa, Bernardo Hees tivesse que deixar o cargo.

O brasileiro foi substituído por Miguel Patrício, português que teve uma passagem bem-sucedida pela AB Inbev e que comanda o negócio até hoje.

Dificuldades que fizeram com que o próprio Buffett chegasse à conclusão de que o valor de 10 bilhões de dólares pagos pelo Grupo para contar com a Kraft havia sido um preço muito acima do real valor da empresa – uma aposta errada que colocou mais um problema para a gestão do negócio.

E assim, além de todas as dificuldades operacionais, a empresa também passou a conviver com problemas de endividamento, uma vez que as dívidas da empresa somam mais de 31 bilhões de dólares.

Eventos adversos que custaram só em 2019, mais de 2,7 bilhões de dólares da fortuna de Buffett, e que também geraram rombos nas fortunas dos bilionários brasileiros – o que fez por exemplo, com que Jorge Paulo Lemann perdesse temporariamente o posto de homem mais rico do Brasil para Eduardo Saverin.

Contudo, o endividamento não é um problema desconhecido para Jorge Paulo Lemann, que revelou que apesar de todo sucesso, a AB Inbev possui mais de 100 bilhões de dólares em endividamento; mas que se trata apenas de um detalhe, visto que a cervejaria já tem alicerces para crescer muito por mais algumas décadas.

Diante desse cenário, para muitos o plano da Kraft Heinz foi um grande fracasso. Além de não conseguir ir além do movimento realizado pela fusão das duas gigantes, a empresa ainda tenta voltar a competir de igual para igual com suas concorrentes, enquanto tenta recuperar suas contas.

Só que apesar dos prejuízos acumulados, Warren Buffett disse que não pretende se desfazer do negócio e continua confiando na capacidade de gestão do grupo brasileiro. Ao todo, o investidor é dono de 27% do negócio.

De toda forma, nos últimos exercícios a empresa conseguiu voltar a lucrar, e deu início a uma nova série de aquisições, como recentemente as brasileiras Hemmer, de molhos e conservas e a empresa de temperos BR Spices e a startup chilena ‘’The Not Company’’, especializada em alternativas veganas; que colocou a gigante em uma nova vertente.

Movimentos que mostram que a gigante está correndo atrás do tempo perdido e tenta voltar a rota para consolidar o plano dos bilionários. E agora restam as perguntas...

Será que a Kraft Heinz vai voltar a brilhar e conquistar ainda mais o mercado mundial?

Será que os bilionários vão acertar mais uma vez?

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