Através do Tempo
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Através do Tempo

A idéia da viagem através do tempo apresenta muitos conflitos paradoxais, que não podem ser resolvidos nas tramas de enredos de literatura, filmes e quadrinhos de ficção científica que em torno dela giram; daí os autores de tais obras ignorá-...

Sergio Ricardo
10 min
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A idéia da viagem através do tempo apresenta muitos conflitos paradoxais, que não podem ser resolvidos nas tramas de enredos de literatura, filmes e quadrinhos de ficção científica que em torno dela giram; daí os autores de tais obras ignorá-los, ou, como é comum, concentrarem-se em um ou outro deles, ou em alguns deles, o qual, os quais, permite-lhes, permitem-lhes, conceber um enredo coerente, mesmo se absurdo, e, aparentemente aos olhos do público, plausível de tão convincente. Steven Spielberg e Robert Silverberg souberam tratar a idéia, emprestando-lhe um tom lúdico, divertidíssimo, o primeiro, nos três filmes da trilogia De Volta Para o Futuro, filmes extraordinariamente inventivos, engenhosos, e o segundo, no livro Correios do Tempo, engenhoso e intrigante; e há Christopher Nolan, que, no filme Interestelar, estrelado por Mathew McConaught, soube emprestar à idéia um tom mais científico, com engenhosidade incomum, despertando o interesse de quem o assiste.

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É idéia corrente nas histórias de ficção científica cuja trama gira em torno da idéia de viagem através do tempo a alteração do curso da história pelo viajante do tempo, caso ele interfira em algum evento histórico relevante, e, principalmente, encontre-se consigo mesmo, ou se o seu eu do passado (ou do futuro) o vê. Para se conceber roteiros coerentes com tal idéia, faz-se necessário que os roteiristas de tais histórias excluam os fatores que os impedem de escrevê-los. Ora, a viagem de uma pessoa de seu tempo, o presente, para qualquer tempo no passado, por si só já altera o curso da história, pois ela, uma pessoa do tempo presente, no passado, ocupa um espaço que, na linha temporal original, não havia ocupado, alterando, portanto, o curso da história, pois a sua presença num lugar em que ela, no curso original da história, não ocupou, é o suficiente para alterá-lo, mesmo que não entre em contato com personalidades históricas relevantes, não se encontre consigo mesmo e o seu eu do passado não a veja.

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Toda viagem através do tempo é também uma viagem através do espaço. Os livros, os quadrinhos e os filmes de ficção científica que envolvem em sua trama a viagem através do tempo ignoram este detalhe. Uma pessoa, ao viajar através do tempo, do tempo presente para um tempo situado há dez anos no passado, percorre, no tempo, o espaço que o separa do local em que a Terra está no momento presente até o local em que ela esteve dez anos antes. Ora, a Terra, um corpo celeste, move-se em torno do Sol, e, movendo-se em torno dele, e sendo por ele atraído, e sendo que ele gira em torno do centro da Via-Láctea, move-se, também, ao redor do centro da Via-Láctea. E onde estava a Terra dez anos antes do tempo presente, no momento em que o viajante do tempo iniciou a sua viagem para o passado? Nas histórias de ficção científica cuja trama envolve viagem através do tempo os autores dão a entender que o deslocamento dos viajantes do tempo deu-se unicamente através do tempo, a Terra permanecendo, imóvel, no mesmo lugar tanto no presente como no passado, o que é impossível.

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É possível a viagem através do tempo? Para alguns cientistas, sim, é, e eles apresentam inúmeras conjecturas em apoio a esta idéia, sustentadas, declaram, em teorias da física recheadas de fórmulas matemáticas sofisticadíssimas. E pergunto-me se em tais fórmulas matemáticas considera-se a realidade, ou tenta-se encaixar a realidade nas fórmulas matemáticas concebidas para dar sustentação às teorias que dão suporte à idéia de viagens através do tempo. Se toda a matéria que há, hoje, no universo, é a mesma que havia no seu início, no instante da sua criação, quando se deu a criação de toda matéria existente, o ovo cósmico, um ponto infinitesimal, nele concentrado, mas compondo outros corpos, sem que nenhuma outra matéria tenha sido criada, e nem destruída, mas apenas transformada, então, posso concluir, um viajante do tempo, por exemplo, ao ir do tempo presente, para um tempo no passado provoca um deslocamento de matéria (a de seu corpo e a do veículo que o transporta), durante a viagem, do presente ao passado, diminuindo, no tempo presente, a quantidade de matéria existente no universo, aumentando, no tempo passado, a quantidade de matéria existente no universo, provocando, uma anomalia no corpo do universo, com conseqüências inimagináveis, catastróficas, pois, rasgando-se o tecido do universo com o transporte de matéria de um tempo para o outro, o caos irá se instalar. A viagem através do tempo não faz sentido. Caso uma pessoa empreenda uma viagem do presente para o passado, no passado ela encontraria o nada, pois a linha temporal não retrocede; segue, sempre, para o futuro, ininterruptamente. E como poderia uma pessoa deslocar-se através do tempo ao mesmo tempo que o tempo segue o seu curso natural? É concebível a viagem através do tempo apenas pela imaginação fértil de artistas, roteiristas de filmes e de histórias em quadrinhos e de escritores de ficção científica e de cientistas, que, em detrimento das ciências, conjecturam idéias implausíveis e emprestam-lhes ares de plausibilidade, concebendo, engenhosos, fórmulas matemáticas, que se encaixam nas suas teorias, sustentando-as, atendendo, antes de tudo, a presunção de se verem como criadores de artefatos que moldam o universo, desrespeitam as leis da física, leis que eles próprios e seus antecessores no campo do conhecimento conceberam, dando a entender para si e para os outros, e gozando de inigualável prazer nesta atividade, que contestam, e desrespeitam, as leis do Criador.

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Se viagem através do tempo é possível, se os humanos podemos ir do presente para o passado, então o nosso tempo é da linha temporal original, e se os humanos também podemos ir do presente para o futuro, o nosso tempo presente pode não ser da linha temporal original, pois, havendo o futuro, este futuro precede, no transcurso do tempo, ao nosso presente - ou não? Ou todos os tempos se misturam, todos no mesmo tempo, todos simultâneos? Se é assim que funciona o tempo, então o tempo como o entendemos inexiste, pois não há o passado, o presente e o futuro, e, portanto, a viagem através do tempo também não pode existir, pois todos os tempos já existem. Se o passado, o presente e o futuro são simultâneos, não podem existir o passado, o presente e o futuro. Se o passado, o presente e o futuro já aconteceram, melhor, já acontecem, então o que há para acontecer?

A viagem através do tempo só pode ser realizada entre o que já existe, e não entre uma coisa que existe, o presente, e uma coisa que não existe mais, o passado, e uma coisa que ainda não existe, o futuro. Ou o passado ocupa um lugar no universo? O passado não é uma coisa só, um objeto guardado numa estante. Não existe um passado, um tempo no passado. Quando se fala do passado, fala-se de qual tempo, no passado? Como se divide o tempo? Em horas, minutos, segundos, décimos de segundos, centésimos de segundos, milésimos de segundo... Qual é a menor medida de intervalo de tempo existente entre dois tempos, dois momentos, dois instantes? E como todos estes tempos, no passado, ficam registrados no universo?

A idéia de viagem através do tempo é intrigante, mas não é factível. É só uma idéia, interessante, fascinante, intrigante, extraordinária, mas só uma idéia.

E se há um tempo futuro ao nosso tempo presente, porque os homens do futuro nunca, numa viagem através do tempo, viajaram para o passado, isto é, para o nosso tempo presente, e nos deram notícia do tempo deles?

Será que algum viajante do tempo do futuro viajou para o presente, e cometeu um erro crasso, provocando um acidente, produzindo uma catástrofe de dimensões cósmicas, e nós não percebemos?

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O corpo de um viajante do tempo, assim que chega ao tempo, por exemplo, passado, terá de ocupar um espaço já ocupado por outros corpos, mesmo que estes corpos sejam moléculas de água em estado de vapor, e ele não os poderá deslocar, pois não se trata de uma viagem através do espaço num mesmo tempo. As partículas - corpos - que ocupam, no tempo passado, para o qual foi o viajante do tempo, um certo espaço - e este fenômeno já está registrado no livro do universo -, o mesmo espaço para o qual foi o viajante do tempo, não permitirão que o corpo do viajante do tempo o ocupe sem provocar atrito; para ocupar o espaço já ocupado por outros corpos o viajante do tempo terá de deslocá-los, mas não pode, pois os corpos - matérias - que os ocupa são do tempo passado para o qual foi o viajante do tempo, e compõem o universo daquele tempo, e sendo o viajante do tempo corpo de um universo de outro tempo, não pode preencher, no tempo passado para o qual foi, nenhum espaço, pois, no tempo do seu destino, todos os espaços estão ocupados, e ele, viajante do tempo, sendo o excesso, será expelido ao colidir com os outros corpos, pois não há, no universo, um limbo, um lugar vazio, onde o nada exista - partículas invisíveis aos olhos humanos são corpos também, e não podem ser entendidos como sendo o nada, e o lugar que eles ocupam o vazio.

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Não existe, no universo, um espaço vazio; não havendo, portanto, um espaço vazio, estando todos os espaços ocupados por matéria (átomo) que compõe ou algum objeto ou gases (e gases são matérias, pois compõem-se, em última análise, de átomos), não é plausível a idéia, recorrente, nos livros, filmes e quadrinhos de ficção científica, de viagem através do tempo. Cabe ao viajante do tempo o cuidado de jamais, no final de uma passagem do tempo presente, o da origem da viagem, para o tempo de destino, o momento em que aporta num outro tempo, seja no passado, seja no futuro, ir para dentro de um prédio, ou de uma montanha, ou de qualquer construção, ou de qualquer formação geológica rochosa. Ora, aqui há uma simplificação da natureza das coisas do universo, pois, em todos os lugares há átomos, uns, condensados, nos objetos sólidos, outros, esparsos, onde há apenas gases; o viajante do tempo, mesmo que, no seu destino, não vá para um local já ocupado por alguma construção, ou por um objeto, irá para onde há gases. No roteiro das histórias cuja trama giram em torno de viagem através do tempo, dá-se a entender que estão desocupados, vazios, os espaços em que há apenas gases, mas não estão, pois havendo, neles, gases, eles estão ocupados, ocupados ou por átomos de oxigênio ou de outros gases, então o corpo do viajante do tempo, ao chegar ao seu destino, algum momento no tempo passado, ou no tempo futuro, mesmo aportando numa planície onde não há construções, nem montanhas, irá colidir com os corpúsculos que ocupam, originalmente, tal espaço, provocando uma singularidade, rasgando o tecido do universo.