A FEICON Digital dos Fabricantes
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A FEICON Digital dos Fabricantes

#0019: O texto “O Gestor de Informação” da última Newsletter abriu uma brecha para discussão do quão importante é para o ecossistema BIM que os fabricantes digitalizem seus produtos, mas em uma discussão no Instagram deu para perceber que existe uma

Tiago Ricotta
11 min
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#0019: O texto “O Gestor de Informação” da última Newsletter abriu uma brecha para discussão do quão importante é para o ecossistema BIM que os fabricantes digitalizem seus produtos, mas em uma discussão no Instagram deu para perceber que existe uma desconfiança em relação a isso: Há como mudar esse cenário? Existe uma oportunidade ainda não explorada?

FEICON BIM (1/7)

Gente.. faz tempo..
Gente.. faz tempo..

Tendo participado de grandes projetos de produção de conteúdo para bibliotecas digitais o que posso dizer é que houve um momento na história em que acreditava que haveria uma FEICON BIM com uma inundação de componentes sendo disponibilizados ao mercado para os projetistas de arquitetura e engenharia.

Tudo começou quando a Tigre ainda em 2011 decidiu publicar seus produtos e houve uma certa resistência do mercado perante o que foi disponibilizado, não por culpa da Tigre, mas o grande problema na época é que não havia nenhuma diretriz ou melhor prática para construção de bibliotecas.

Outro grande problema enfrentado pela Tigre era a praticamente inexistência de qualquer referência de conhecimento BIM para MEP em 2011, não se tinha um guia de melhores práticas por parte dos fabricantes de software sobre como isto deveria ser feito e como todo o processo de pioneirismo existe a dor e o benefício, no caso, foi muita dor ao lado de muito benefício também.

Diante deste contexto, quando a Deca decidiu fazer a sua biblioteca de objetos digitais a decisão que foi tomada em conjunto com eles foi a de fazer um processo de co-criação com o mercado para que o produto que fosse entregue tivesse a melhor resposta possível e evitar um buzz negativo.

Quem participou do processo? Um conjunto de 10 empresas com representantes de construtoras, incorporadoras, arquitetos, projetistas, orçamentistas e afins.

Foi feito uma lista que chegou a ter 45 atributos de informação a ser inseridos nos componentes e no final do dia foi limitado a 13 atributos escolhidos que permeava minimamente as necessidades daqueles 10 participantes do processo de co-criação.

Claro que olhando para trás cortaria mais uns 8 atributos, mas este é o tipico caso que não vale a pena exercitar o que poderia ter sido.

Em uma reunião da ABNT em 2012 apresentei a lógica de trabalho, fizemos um beta de 30 componentes primeiro que foram testados e aprovados pelas empresas participantes e assim com o "Go" oficial a Biblioteca foi produzida e disponibilizada no mercado em março/2013 na feira Revestir em São Paulo.

No geral, o feedback foi muito positivo e o senhor mercado na época aprovou o conteúdo, mas obviamente é impossível agradar a 100% dos profissionais e até por este motivo foi decidido que a biblioteca seria livre e editável, ou seja, não ficou feliz? Sem problemas, não precisa modelar tudo do zero, tem uma base fidedigna ao produto para ser adaptável as suas necessidades, be happy.

Eu lembro que na feira seguinte, a FEICON de 2013, teve vários e vários fabricantes querendo produzir seus produtos, mas por qual razão então não houve uma FEICON digital na sequência?

Eis o que vamos discutir aqui.

El Marketing (2/7)

De onde vem a grana...
De onde vem a grana...

A grande questão que envolve os fabricantes é que no geral são empresas de médio e grande porte que enxergam o negócio de biblioteca digital como uma perna do marketing tradicional e não do business digital, ainda mais naquela época em que muita gente ainda estava no Orkut.

O que acabou afastando os fabricantes em 2013 da produção de conteúdo foram duas coisas:

  • Como são empresas que dependem de aprovação de orçamento elas deveriam esperar o próximo ano fiscal para aprovar verbas para os projetos, o que naturalmente esfriava o negócio e foi exatamente o que ocorreu.
  • Em termos de estrutura interna, deixar para o marketing puxar um projeto de biblioteca digital é muito complicado porque o pessoal tem que convencer muita gente de outros departamentos de que aquilo é importante, por mais que fosse a coisa certa a ser feita, o timing do negócio não era o ideal.

Deu muito certo com a Tigre e a Deca em produzir suas bibliotecas porque foram as áreas de negócio que puxaram o carro em conjunto com o marketing, e aí vem a pergunta: uai, se você sabia qual era a área que precisava ser buscada para tocar novos projetos porque não procurou outras áreas de negócio?

Simples, por mais que fosse a área de negócio que puxasse o carro de verdade quem pagava a conta ainda assim era o marketing, ou seja, ou o marketing já estava convencido e tentava convencer a área de negócio ou o contrário deveria ser feito, e nisso o esforço de venda seria enorme.

Até por isso e outras razões de viabilidade economica deste tipo de projeto, por uma decisão de negócio na época, a empresa em que estava decidiu que faria somente a biblioteca da Deca, se é para fazer uma que seja a melhor da maior do mercado, ponto. Foco 100% neles e até por isso foi muito gratificante trabalhar com os profissionais de excelência que estavam na engenharia de aplicação, aprendi muito naquele período.

Como curiosidade, vaso é de planta, privada é feio que dói e o termo correto é bacia sanitária ;)

El Señor Mercado (3/7)

Os mercados são sempre eficientes?
Os mercados são sempre eficientes?

Na caixinha que deixei no Instagram essa semana perguntando qual era a maior dor que os usuários têm em utilizar bibliotecas BIM de fabricantes foi quase unânime as questões de oversizing, overmodeling e overinformation.

Uma coisa que o mercado não entende de maneira nenhuma é que os fabricantes não irão disponibilizar bibliotecas exclusivas para cada uso BIM, isso não tem viabilidade econômica, o máximo que irá ocorrer é um fornecedor de tecnologia filtrar as informações para download de acordo com o uso, isto a tecnologia resolve e é até mais inteligente.

No fim, com a curta verba que alguns fabricantes conseguem aprovar eles têm que atender o máximo possível de usuários e ainda existe a dificuldade de que eles não conseguem saber internamente se uma biblioteca está sendo bem-feita ou não, pois na maioria das vezes é preciso ter alguns anos de prática para analisar bem um componente.

E o mercado também não sabe o gol contra que faz ao sempre criticar os produtos que são disponibilizados, quando um guru metido a sabichão sabe tudo critica as bibliotecas disponibilizadas ele só está ajudando a manter quem não produziu ainda seus produtos a deixar como esta e não produzir nada.

O que não dá para aceitar é a desculpa que muitos e muitos escritórios ainda usam de que não utilizam a tecnologia porque não são todos os fabricantes que disponibilizam seus produtos, aí é jogar a incompetência para o colo do outro.

Lembrem-se: o mercado é sim muito eficiente, a conta tem que fechar, ninguém vai disponibilizar um conteúdo sem esperar que haja retorno disso em algum momento. Também não é papel dos fabricantes disponibilizar bibliotecas genéricas como já ouvi em alguns fóruns.

A Gestão (4/7)

Fazer a gestão de 935 produtos de um grande fabricante de louças e metais é uma tarefa que exige muita atenção e energia.

É lindo você entregar uma biblioteca uma vez, mas e o esforço para mantê-la atualizada com os últimos lançamentos para o mercado? E quando uma cor de um produto muda de nome de dourado para gold? E quando a cor marrom para de ser comercializada?

É meus amigos, fazer gestão de 10 produtos ou 20 produtos é até tranquilo, mas quando você tem um catálogo enorme para gerenciar é preciso muita organização para conseguir dar conta de todas as alterações que devem ser feitas entre um ano e outro, as vezes de um quarter para o outro ou mesmo de um dia para o outro.

O que chega nas mãos dos projetistas é o resultado de uma equipe enorme de profissionais, diria que um simples componente de uma bacia sanitária nova para ser aprovada e disponibilizada ao mercado seria preciso algo em torno de três ou quatro dezenas de profissionais de vários departamentos diferentes.

Visitar a fabrica de louças e metais da Deca te da uma empatia enorme com todos os profissionais que estão ali, assim você entende que o que chega na sua mão para colocar no projeto é o sangue, suor e lágrimas de muita gente, dê valor.

A Tecnologia (5/7)

Vai ficar tudo bem
Vai ficar tudo bem

Se a gestão é algo crucial para ter uma boa biblioteca imagina então quando a própria tecnologia acaba criando alguns problemas que trazem algumas dores de cabeças grandes para todo mundo?

O BIM faz perguntas que o CAD não faz, já diria um grande amigo em meu início de carreira.

Em 2012 o mundo era outro e as necessidades, estratégias e formas de modelagem também eram outras e, assim como tudo na vida, é preciso atualizar algumas coisas e fazer escolhas.

O dilema das versões de arquivos, por exemplo: Como resolver? De um lado uma versão de arquivo antiga abrange mais profissionais que ainda não atualizaram os seus softwares, mas ao não atualizar a versão perde-se em novas funcionalidades que muitas vezes até cancelam uma estratégia de modelagem e faz a biblioteca digital envelhecer mal.

Quanto mais antiga for uma versão de arquivo, a depender do software que você está utilizando para produzir a biblioteca, pode-se ter muito problemas com o upgrade de versão pois informações podem se perder, lookup tables podem parar de funcionar, pode-se ter um caos completo.

Este é um fator que muitas vezes é desconsiderado no momento da produção dos componentes, mas é importante ficar atento as atualizações para não ter problemas no futuro, principalmente com relação a gestão de tudo.

Existem formas de mitigar isto, mas não quero entrar neste tipo de detalhe para proteger a Newsletter e mantê-la independente.

Parece simples fazer um projeto desses, mas são questões importante que devemos ficar sempre atentos.

PMF – Product Market Fit (6/7)

Segue o @joaokepler que ele explica muito bem esses conceitos :)
Segue o @joaokepler que ele explica muito bem esses conceitos :)

Se chegamos até aqui falando que existe uma dor latente no mercado que ainda não foi solucionada... pô... está aí uma oportunidade, não?

Compartilhando essas experiências e dores aqui dou um pouco do caminho das pedras em relação ao negócio de produção de componentes e se alguém quer se aventurar neste terreno estou por aqui para conversar, até porque muita coisa evoluiu de 2011 para cá.

Dito isto, um grande problema a ser solucionado e que nenhum produtor de componentes conseguiu resolver ainda é o PMF, porque no geral os contratos são desenhados para pagarem por desenvolvimento de um produto, ou seja, o Fabricante X contrata a Empresa Y para produzir 100 componentes, a Empresa cobra R$ 100 (fictícios) por componente e então temos um contrato de R$ 10.000,00.

Essa conta não fecha para a empresa produtora de conteúdo e é ilusão achar que sim.

Então o que precisa ser pensado é como entregar mais valor para o fabricante e consequentemente para o mercado em relação a bibliotecas BIM, mas aí mora uma dificuldade enorme em busca do PMF, pois o mercado se acostumou com o gratuito e tenho minhas dúvidas se a conta fecha só com a verba de marketing do fabricante.

Então, tem que ser trabalhado o modelo de negócio e a distribuição, fatalmente será este o caminho para fazer isto dar certo.

Até porque existe uma pergunta a ser respondida e que vale 1 milhão de estalecas: produzir uma biblioteca com foco no BIM da retorno?

Eu diria: depende.

Cenário atual e futuro (7/7)

Acredito firmemente que o timing atual é muito melhor tanto para produtores de componentes, fabricantes e até mesmo para o mercado.

Já existem cases consolidados, melhores práticas a rodo na praça para evitar problemas com relação a expectativa do que se deve produzir, a questão da pandemia e o cancelamento dos grandes eventos moveu os recursos das empresas dos eventos físicos para produção de componentes digitais, enfim, tem vários cenários em que se favorece esse desenvolvimento.

Resolvendo-se a questão do modelo de negócios acredito que a coisa para de pé, existe gente muito boa e comprometida testando novos formatos e jeitos bem interessantes de resolver esta dor, vamos ver como o mercado precifica isto.

Se você gostou do texto e do conteúdo da AEC Experience não deixe de convidar seus pares para nos seguir aqui na Pingback, cada dia que passa estamos crescendo mais e mais e com sua ajuda podemos ir longe 😊

Obrigado,

Abs.

Tiago Ricotta

Publicado em 25 de Agosto de 2021 às 14:00