A briga
0
0

A briga

Uiliam da Silva Grizafis
7 min
0
0

Camila, a moça morena que Vitor paquerava estava sentada num banco de praça ao lado de um homem forte e robusto, cabelos louros, talvez teria um desses sobrenomes alemães de difícil pronunciação. Vitor enfureceu-se, esqueceu do poema, do prêmio, dos aplausos e foi diretamente ao encontro dos dois.

- O que está acontecendo aqui? – Pergunta Vitor.

- Eu é quem pergunto, jovem, pois não? – Responde o rapaz.

- Esta moça, que você tenta cortejar é minha namorada.

Camila se levanta, assustada corre para o lado de Gerard que tenta acalmar seu amigo. Vitor, furioso, chuta, com toda a sua força o rapaz que estava sentado, neste momento, começa uma disputa assustadora. O jovem louro e alto levanta-se, o agarra pelo pescoço e o derruba. Victor logra dar alguns socos na cara de seu inimigo que cai de costas ao lado de Gerard, Victor aproveita para continuar a dar golpes fatais, alguém que estava perto chama a polícia que prontamente aparece e leva os dois brigões para a cadeia.

Os fatos que se sucederam nas últimas horas fizeram com que Gerard se desestabilizara um pouco. Seus pensamentos corriam numa velocidade assustadora. De um lado estava a pianista que arrebatou seu coração, do outro, estava Victor algemado e sendo levado para a delegacia. Seus planos de ir atrás da espanhola foi por água abaixo, seu amigo, claro, precisava dele. Após os ânimos se acalmarem Gerard foi até a delegacia tentar falar com seu amigo, o encontrou dentro de uma cela, junto com outros presos que estavam sujos e fedidos.

- Fui do céu ao inferno, meu amigo – disse-lhe Vitor.

Gerard não sabia o que dizer, queria culpar seu amigo por perder a oportunidade de viajar e encontrar-se com Mari, seria sua oportunidade de conhecer a jovem donzela. Vitor não demonstrava nenhum arrependimento por ter feito aquilo, foi possuído por uma raiva dilacerante. Há uns meses, usufruía de todos os prazeres possíveis, gastara seu dinheiro com bebidas e mulheres. A religião, para ele, era uma falcatrua, não servia para nada, só queria viver. Gerard, após conversar com seu amigo sai da delegacia e caminha pelas ruas da cidade, com a cabeça baixa, sem saber o que fazer. O jovem, que brigou com Vitor, foi parar no hospital ensanguentado e com alguns ossos quebrados. “O fiz e o faria de novo”, foi a frase de Vitor que percorria a mente de nosso herói. Pensava em como tirar seu amigo da cela, quando de súbito, teve uma surpresa, ao passar em frente a um prostíbulo, vê uma moça, parecida com Camila, a entrar no local. Perturbado, Gerard para de caminhar, por alguns segundos medita e logo a segue.

Ao entrar no bordel, começa a procurar aquela jovem morena, queria ter certeza de que, de fato, era Camila. Caminhava por todos os lados e não a encontrava. As mulheres o tocam, o convidam para entrar no quarto, Gerard, estupefato, não responde a nenhum dos convites, deu duas ou três voltas no local e não a encontra. Encontrou uma cadeira vazia, sentou-se e, sem saber o que fazer, começou a viajar nos mais profundos de seus pensamentos, quando, de súbito, aparece Camila, o vê, vá ao seu encontro, puxa uma cadeira e se senta ao seu lado. A primeira intenção de Gerard era fazer com que Camila não se sentisse mal, toca em seu ombro e a tranquiliza. Conversaram por mais de uma hora, Camila contou-lhe tudo da sua vida.

- Camila, estou muito feliz por haver te conhecido, agora que sei da tua vida, podemos conversar como amigos.

- Sim, também estou feliz por havê-lo conhecido, sei que você é cristão e não deveria estar num lugar desses. Gostaria de procurar um outro lugar?

- De forma alguma. Aqui te encontrei e aqui ficarei.

- Talvez Deus não esteja feliz que o senhor esteja aqui.

- Eu penso diferente, eu acho que, se Cristo visitasse a terra nesse momento, ele estaria conversando com você na mesma forma que estou. Enquanto a religião julga, Cristo ama. Conhece a bíblia?

- Conheço um pouco.

- Então, Cristo comia junto com publicanos e pecadores, chamou Mateus[1], cobrador de impostos, foi parar na casa de Zaqueu[2], que era um safado, enquanto os religiosos propunham apedrejar uma mulher que foi pega em adultério Cristo calmamente escrevia na terra[3].

- Você sabe o que escrevia?

- Não sei, as escrituras não revelam, mas posso supor. Vamos fazer um exercício de suposição?

- Claro.

- O que você acha que Cristo escrevia enquanto os religiosos tentavam provocá-lo e apedrejá-la?

- Minha suposição, por mais que as escrituras não falam sobre isso, seria que Cristo escrevia os pecados de cada um daqueles que queriam apedrejá-la.

Gerard não aguentou e começou a rir alto. Rio tão alto que chamou a atenção de todos que estavam no local.

- Talvez, - responde Gerard após controlar-se – uma boa suposição. Mas o mais interessante de tudo é que Cristo não apedrejou, ele amou e perdoou. Mas vamos falar de outra coisa? E a mulher Samaritana que foi tirar água do poço?[4] Não sei se Cristo o fez de forma intencional, mas, sentou-se junto ao poço de Jacó e mandou seus discípulos irem à cidade buscar comida. Cristo poderia ir junto com eles, mas decidiu ficar. Ora, de repente chega uma mulher Samaritana, imagino que ela ao olhar aquele Judeu, sentado junto ao poço, deve ter pensado que Ele jamais proferisse alguma sílaba, pois os judeus os desprezavam, então, ela simplesmente decide fazer seu trabalho, que era tirar água do poço. Quando ela menos se dá conta Cristo lhe pede água. O espanto da mulher Samaritana foi tamanho que, surpreendida, lhe pergunta: “Como tu sendo um homem judeu me pede de beber a mim, que sou uma mulher samaritana”? Tenho a impressão, Camila, que o espanto daquela mulher não foi tanto o Homem judeu lhe proferir alguma palavra, mas sim pedir-lhe um favor, que talvez fosse mais agravante. Logo, Jesus lhe respondeu: “Se conhecesse o dom de Deus e quem é que está lhe pedindo água para beber, você pediria, e ele lhe daria água viva”, viu como o papel se inverteu? A água que a mulher lhe podia dar era natural, mas a água que Cristo lhe podia dar era viva! O mais interessante de tudo isso, e o que me deixa petrificado, é que, além de ela ser samaritana, também havia tido cinco maridos, e o que tinha naquele momento não era dela. “Quem beber desta água voltará a ter sede, mas aquele que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede. Pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna”, disse-lhe Jesus. Essa mesma água está disponível nesse mundo caótico, e está à nossa disposição.

- Eu bem sei disso, e acredito, inclusive, está disponível no lugar deplorável que se encontra Vitor neste momento.

Ali se encontrava os dois, caro leitor, em um prostíbulo, lugar que se encontrava todo tipo de gente se prostituindo enquanto os dois falavam de água viva. Gerard pensou em trocar de assunto, de súbito, a imagem da espanhola retornou à sua mente e decidiu contar-lhe à Camila sua paixão. Camila o incentivou a ir procurá-la. Nosso herói decidiu fazê-lo, mas lhe pediu um favor:

- Vá visitar Vitor, converse com ele, enquanto eu viajo, estarei tranquilo em saber que você estará com ele.

Camila prometeu. Gerard se levanta e sai do prostíbulo decidido em encontrar a pianista enquanto Camila retornou ao seu trabalho. A conversa fluiu e trouxe paz ao coração de Gerard, da mesma forma trouxe alegria ao de Camila. Os dois agora tinham uma missão e falaremos disso no próximo capítulo.



[1] Mateus 9:9-13.

[2] Lucas 19:1-10.

[3] João 8:1-11.

[4] João 4:1-42.