Gerard é um jovem que cresceu sujando-se na terra e no lodo. Conta-se que no dia em que nasceu, no ano de 1989, houve muita euforia e fogos de artifícios. Havia chegado a um mundo estranho, não percebia isso quando era miúdo, só queria brincar. Brincava muito na terra, amava isso e quando chovia era melhor porque havia lodo. Aprendeu a andar em bicicleta muito cedo, caía, levantava-se, volta a cair-se e a levantar-se, naquele momento não sabia que a vida lhe traria vários tombos e recomeços. À medida que foi crescendo queria saber sobre Deus e um dia perguntou à sua mãe onde ele morava, ela, vendo a curiosidade do pobre menino e com a bondade de mãe respondeu que morava no céu. Era tão inocente que acreditava que o sol era feito para secar as roupas. Tinha medo do escuro, medo de perder sua mãe, o medo é feio e aterroriza, mas tudo acabava bem. Não tinha a mínima ideia de como seria seu futuro. Só vivia, apenas vivia. Uma de suas artes mais ousadas era “tacar” fogo nos matagais, havia muito mato, amava quando estavam secos. Os vizinhos reclamavam, mas nosso herói gostava. Despertava-se, brincava, vivia, dormia, e no outro dia tudo estava igual. Gostava de jogar futebol, andar de bicicleta, brincar de esconde-esconde, não havia preocupação nem tampouco tristeza. Após uma tarde de travessuras as crianças se deitavam no chão e olhavam o céu colorido quando o sol se punha. Conversavam entre si, diziam com o que cada nuvem se parecia, comentavam sobre o colorido que o céu ficava sem saber que eram os poetas do universo, era tudo sem intenção, tudo tão natural, tão espontâneo, respiravam o ar mais puro que pudesse haver. Junto com o horizonte que mostrava o espetáculo quando o sol ia se escondendo, havia uma montanha enorme e um pouco mais perto das crianças, os gigantes eucaliptos. Era arte pura, mas quem era o artista? As crianças apenas narravam a poesia colorida e dançante de um fim de tarde. No outro dia, era tudo igual. Gerard estava brincando e correndo pelas ruas do bairro quando sentiu sede, no mesmo instante foi correndo para sua casa para beber água, chegou na cozinha, abriu a geladeira e viu um copo cheio, sedento pega o copo e dá uma tragada forte, sentiu um susto, pois o líquido desceu queimando pela sua garganta e chegou ao estômago, gritou e chorou desesperadamente, sua mãe e sua avô foram ao seu encontro sem entender o que se passava, para a surpresa de ambas, o líquido que havia no copo não era água, mas sim cachaça da dona Carula, sua avó, a velha, claro, sentiu-se horrendamente culpada e pediu desculpas à criança. |
Dona Carula era uma senhora sofrida, afundada na sarjeta e na cachaça. Casou-se muito jovem, não amava seu marido, foi obrigada a casar-se com ele. Muito jovem criou quatro filhos e duas filhas, todos aprenderam a trabalhar muito cedo, porque também tiveram uma vida sofrida. O sofrimento de dona Carula começa quando descobre que seu marido a traía com outras mulheres, a traição era tão humilhante que um dia ela chegou em casa e encontrou-se com a fulana, ingênua, pensou que era alguma empregada, mas não, o velho era safado mesmo, havia levado a amante para dentro de sua própria casa. Às vezes o velho a deixava, ia-se com outra, deixando-a com seu casal de filhos mais novos, a última filha, ainda não havia chegado. O antepenúltimo e a penúltima quando eram crianças moravam num sítio. Aconteceu de um dia o velho ter ido embora e levado tudo o que tinham em casa, Carula chegou com seu casal e não encontrou nada dentro de casa. A mãe, preocupada com os filhos vai para fora e arranca alguns matos ou capins e leva para dentro, o objetivo era fazer um colchão de matos para seus filhos dormiram confortáveis. Quando ia para a cidade, pegava seu cavalo e dois cestos que serviam para colocar Jaurício e Marli em cada um deles, pegava uma corda e passava por cima do cavalo, isso possibilitava que cada um dos cestos ficasse colgados cada um de um lado, de um lado colocava o menino dentro de um cesto, e a menina do outro lado, um pesava mais que o outro, são sei qual dos dois era mais gordinho, deveria ser Jaurício, pois era mais velho, o cesto que tinha menos peso Carula colocava umas pedras para equilibrar, assim ia para a cidade comprar. O tempo ia passando e nossa heroína precisou de dinheiro para dar comida aos seus filhos, sem trabalho e sem sustendo (o velho não ajudava em nada), teve que prostituir-se para alimentar as crianças. Conheceu a cachaça, fumava e bebia para livrar-se das dores, mas as crianças eram felizes e inocentes. Seu filho Jaurício, quando completou quatorze ou quinze anos, contatou seu pai para ir morar com ele, desejava continuar a estudar, pois, onde morava não havia o segundo grau, o pai disse para ir, que lhe daria estudo, porém, quando chegou, o pai o mandou trabalhar, não deu nenhum estudo, além de mandá-lo trabalhar o mandou para outra cidade, no interior de Santa Catarina. Lá, com seus quinze anos, conhece Lucimar, ele com quinze e ela com vinte quatro, se enamoram e se casam quando ele cumpre seus dezoito anos. Com vinte ganha seu primeiro filho, o jovem Gerard. |
Gerard tinha um amigo que se chamava Edmilson, os dois, exaustos de correr e brincar e após Gerard ter tragado a cachaça, deitam-se no chão, recostam suas cabeças numa pedra e começam a poetizar: |
- Olha essa cor vermelha – diz Gerard, impressionado com a beleza. |
- Olha essa cor laranja – diz Edmilson. |
- Essa nuvem parece um cachorro e aquela outra parece uma lua – emociona-se Gerard. |
Admiravam-se com o colorido do céu, a dança das árvores, o canto dos pássaros acompanhado com o vendo frio que rachava os lábios. |
Súbito o menino olha para o céu e tenta imaginar qual era a aparência de Deus. Além do menino possuir esse dom contemplativo, também possuía o dom argumentativo, se os argumentos eram válidos ou não isso é outro assunto, mas começava a imaginar a Deus e pensava: “Se Deus é tão poderoso, será que ele pode desfazer-se do seu poder a ponto de não conseguir mais recuperá-lo”? Tudo era um mistério sobrenatural que sua capacidade intelectual não conseguia suportar. |
Após esse dia, sua mãe e seu pai precisaram sair e deixaram ele e seu irmão aos cuidados de sua avó Carula, a senhora, como sempre, embebedou-se, mesmo assim soube cuidar das crianças, pegou o pequeno Gerard, colocou-o sentado em cima da pia da cozinha e enchia os copos, embebedaram-se de água: - Vamos beber! Vamos tomar pinga! Eee cachaça veia... O moleque se divertia. Quando sua mãe chegou encontrou ela e as duas crianças brincando de, não lembro muito bem, mas parecia ciranda, e a velha, claro, morta de bêbada. Junior, o irmão mais velho amava de paixão seu irmão maior, quando ia estudar no jardim de infância, sua mãe comprava um pacote de bolacha recheada para que comesse na hora do intervalo, a criança comia só até metade do pacote, a outra metade, deixava para seu irmão comer quando chegasse em casa, pois sabia que ele gostava muito dos doces. |