O REENCONTRO
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O REENCONTRO

Uiliam da Silva Grizafis
5 min
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Gerard esperou por longos dois meses até a chegada de Mari. Ele mesmo a foi a ver na estação de trem. Fazia um horrendo calor, era verão, ele se aprontou e foi em busca do que seria a sua razão de viver. Quando a viu correu para os seus braços. A moça estava, como sempre, magnífica. Um vestido rosa, colares de pérolas, um lindo batom vermelho que sujou toda a camisa branca do rapaz. Ele a levou para sua casa e, juntos, tomavam cervejas, iam ao rio e, por fim, casaram-se no dia treze de fevereiro.

Ninguém mais soube de Vitor, diziam que ele andava perambulando pelas ruas de outro estado. O partido conservador conseguiu assumir o poder e governava com alguns tumultos a cidade de Lauro Müller. O professor Walter publicou mais livros e continuava a dar aulas enquanto Joana encontrou um homem que trabalhava incansavelmente na mina de carvão. Ela, também passou a estudar filosofia e passou a lecionar com amor nas escolas da cidade. Um dos pontos tratados no começo deste livro era as incertezas que invadiam a cabeça do nosso jovem sobre a existência de Deus. Ele não era ateu, mas gostava de questionar muitas coisas que se falava nas congregações. - Temos que ousar questionar tudo -, sempre falava.

Um dos dias mais tristes para Gerard foi quando soube do falecimento do seu melhor amigo. Dom Chico teve uma parada cardíaca um mês após o casamento de Gerard e Mari. O jovem chorou amargamente durante horas e no funeral não saiu de perto do caixão em nenhum momento. O padre fez a missa e após o término, antes de enterrá-lo, Gerard pediu para falar. Estava chovendo e todos estavam apertados dentro da capela do cemitério. Gerard pôs-se a frente do púlpito, enxugou as lágrimas e começou a falar:

- A morte é um mistério, para muitos pode ser o terror que os assombra, para outros, pode ser o descanso e o prazer de uma missão cumprida. O salmista disse que “preciosa é para o Senhor a morte dos seus santos” e meu nobre amigo foi um destes. Combateu o bom combate. Sêneca afirmou que deve-se aprender a viver por toda a vida, e, por mais que tu talvez te espantes, a vida toda é um aprender a morrer. Um dos maiores impasses entre o homem e a morte é que ele não quer pensar nela, se esquiva, e ao esquivar-se ignora sua condição deplorável, corruptível e degenerável. Agostinho, o grande filósofo cristão que meu amigo tanto admirava, quando a morte de sua mãe o acometeu disse: – nesse momento Gerard tira um papel do bolso e lê - “Mais tarde, ouvi que certo dia, enquanto estávamos em Óstia, conversando com alguns amigos meus em confidência materna sobre o desprezo desta vida e o bem da morte, estando eu ausente, eles, surpresos da virtude feminina que tu lhes deste, perguntavam se não temia deixar seu corpo tão longe da pátria, ela respondeu: ‘nada está longe de Deus, e não há perigo de que ele, no fim dos séculos, não saiba onde me encontrar para me ressuscitar’”. Entendemos nossa finitude e imperfectibilidade como consequência do pecado, e que sem a graça divina de Jesus Cristo estaríamos perdidos. Essa graça nos salva. Cristo levou nossos pecados no madeiro, não a merecemos, mas Deus nos amou primeiro. Dom Chico descansou, foi temente a Deus e nos deixou um grande legado.

O jovem terminou de falar e as pessoas seguiram para o lugar onde o corpo ficaria e assim Dom Chico descansou.

“Alguns vem, outros vão”, pensava Gerard. “A vida é um sopro e a morte um mistério, até o nascimento é, pois, não lembramos deste dia. Nascemos com prantos e morremos da mesma forma. Viemos da terra e para lá retornamos. Quando chegar nossa hora, descobriremos esse impasse.”

Gerard foi para sua casa acompanhado de sua esposa. Sempre falavam em ter um filho, - Um dia se lamenta uma perda, mas haverá outro em que comemoraremos uma chegada -, dizia Gerard para Mari que já falava muito bem o português. Dona Carula conseguiu parar de beber, passou a viver na roça novamente. Dona Lu, viveu feliz com seu esposo. Junior, continuava a trabalhar. Alguns desapareceram, alguns morreram, mas todos estão na mais profunda lembrança. Aqui que foi construído e vivido deve permanecer, não deve ser destruído, aquilo que já não presta, ou precisa ser reformado ou descartado, mas as coisas boas, devem ser preservadas para as gerações que um dia virão.

Essa obra não foi escrita para esclarecer o que não está esclarecido, foi um intento de colocar para fora o aquilo que não está aclarado dentro de nós. Terminamos. Há respostas? Claro que não, essa não é a função da filosofia e nem todas as literaturas têm essa função. Tudo o que precisamos fazer é voltar a ser criança, olhar para o céu, ver as estrelas, a lua, as cores do pôr do sol, ouvir os grilos, ver os vagalumes, cheiras as flores e desfrutar daquilo que Deus deixou como uma bela arte.