Ataques homofóbicos contra a torcida do São Paulo ultrapassam décadas
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Ataques homofóbicos contra a torcida do São Paulo ultrapassam décadas

O Sport Club Corinthians será julgado no dia 23, próxima quinta-feira, por conta dos xingamentos homofóbicos proferidos por parte da torcida no jogo contra o São Paulo pelo Campeonato Brasileiro. De acordo com súmula do árbitro Wilton Pereira...

Rômulo Souza Rosa
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O Sport Club Corinthians será julgado no dia 23, próxima quinta-feira, por conta dos xingamentos homofóbicos proferidos por parte da torcida no jogo contra o São Paulo pelo Campeonato Brasileiro. De acordo com a súmula do árbitro Wilton Pereira Sampaio, além das agressões verbais também ocorreram arremessos de moedas e um isqueiro no lateral são-paulino Reinaldo. 

Conforme a denúncia feita pela procuradoria do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, o clube paulista será enquadrado no artigo 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, que qualifica como infração a prática de “ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência”.  

O Corinthians, caso condenado, poderá perder os pontos ganhos na partida, como também pagar multa de até 100 mil reais.  

Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net
Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Ofensas históricas 

Essas ofensas homofóbicas não são fatos recentes. Há décadas torcedores de outros times paulistas chamam os são-paulinos de “Bambi”, personagem da Disney representado por um veado-de-cauda-branca. Esse apelido ficou atrelado a figura do ex-volante do Corinthians, Vampeta. O hoje comentarista, nos anos 90 em uma entrevista após um jogo teria referido a torcida do São Paulo de forma pejorativa de “bambis”

Historicamente os gays no Brasil foram associados, de forma depreciativa, ao animal do desenho animado. Porém, os insultos homofóbicos nos gramados tiveram origem em um fato racista na década de 10 no Rio de Janeiro. A época jogadores de futebol negros não eram aceitos nos gramados. Por esse motivo os atletas do Fluminense passavam pó-de-arroz, usado por mulheres naquele tempo, para ficarem mais brancos. Assim a torcida do tricolor carioca ficou conhecida como pó-de-arroz.  

Logo o fato de usar um produto utilizado somente por mulheres seria motivo de chacota da torcida rival. Esse apelido mais tarde também migrou para os lados do Morumbi onde tinha em seu plantel o Diamante Negro, Leônidas da Silva, que também utilizou o  pó-de-arroz. Conforme afirma o Prof. Dr. João Ricardo Cozac, Presidente da Associação Paulista da Psicologia do Esporte, essa forma de menosprezar o adversário com insultos preconceituosos vem de muito tempo e “ganhou forma numa fala absolutamente infeliz” do jogador Vampeta.  

Caso Richarlyson  

Como não bastasse o apelido para torcida, um jogador em específico foi alvo de ofensas homofóbicas e piadas de péssimo gosto. Richarlyson Barbosa Felisbino, jogou durante cinco anos no São Paulo e por todo esse período sofreu com insultos e xingamentos por todos os rivais paulistas.

Apesar de ter conquistado o tri brasileiro e um mundial de clube pelo tricolor paulista, Rischarlyson, atualmente autando como comentarista no Grupo Globo, presenciou por diversas vezes a torcida do time que defendia ignorar seu nome quando era cantada a escalação pelos presentes no estádio. 

Em 2007 o jogador processou o dirigente José Cyrillo Junior que no programa “Debate Bola” da TV Record  havia o chamado indiretamente de homossexual. Entretanto, na sentença que negou o pedido do esportista, o juiz Junqueira Filho disse no despacho que “Futebol é jogo viril, varonil, não homossexual.” Não há ídolos de futebol que são gays”.  

Outro episódio infeliz foi na passagem de Richarlyson pelo Guarani de Campinas. Logo após ser anunciado como jogador do clube, torcedores começaram a publicar ofensas e piadas contra o meia. Além das provocações o estádio Brinco de Ouro foi alvo de bombas antes da coletiva de apresentação do atleta.   

O esporte como espectro da sociedade

Para muitos especialistas o futebol é também um reflexo da sociedade em que vivemos. Fato é que como no futebol é difícil de ver homossexuais assumidos em algumas profissões, como forças armas e agentes de segurança pública. Ao contrário do futebol feminino, onde observamos o debate mais avançado, poucos jogadores assumiram publicamente sua orientação sexual. Quando isso ocorre, dificilmente o atleta tem grandes êxitos no esporte, como no caso do inglês Justin Fashanu, primeiro jogador de futebol a se assumir gay, que cometeu suicídio em 1998.  

Contra a corrente desta onda de ódio, alguns clubes no ano passado fizeram campanhas de modo a conscientizar os torcedores e apoiar a causa LGBTQIAP+. O Vasco da Gama em particular criou uma camisa com as cores da bandeira do movimento. No jogo contra o Brusque pela série B, o argentino Germám Cano após o gol, levantou a bandeira de escanteio com os cores arco-íris colocadas no gramado do São Januário.    

Segundo o relatório anual do Grupo Gay da Bahia, em 2021, 300 LGBT+ sofreram por mortes violentas no Brasil, 8% a mais que em 2020. Ainda de acordo com o instituto, somos o país que mais mata bissexuais, lésbicas, gays, e transsexuais. Conforme as estatísticas é uma morte a cada 29 horas.  

Isso nos leva a acreditar que não só no futebol como em todos os lugares devemos não só punir essa categoria de violência, como pode acontecer com o Corinthians na próxima dia 23, como também investir em educação para que as novas gerações não cometam os erros do passado.