O que podemos aprender com Abel Ferreira?
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O que podemos aprender com Abel Ferreira?

Você já se perguntou o que a classificação histórica pode te ensinar ou motivar em sua vida?

Felipe Benevides
7 min
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O futebol é mesmo uma caixinha de surpresas, algumas boas, outras amargas. A paixão nacional possui a maestria em nos recordar do como o improvável, impensável pode surgir de repente e transformar a tristeza de um instante atrás na mais profunda alegria, um sentimento que fortalece nossas esperanças e contagia milhões por todo o país.

Na noite passada, vivemos mais um desses momentos mágicos. Em uma partida de 180 minutos, o grande protagonista em campo foi o Inusitado F.C. Isso se você olhar sob um prisma generalista. Na verdade, a partida de ontem foi uma ode à estratégia, ao trabalho duro, à superação das dificuldades, ao trabalho em equipe, de fato, o protagonista ontem foi inusitado em uma partida com 22 jogadores em campo...pois ele estava fora dele... falo de Abel Ferreira.

O novo rico do futebol está em uma temporada incrível, avassaladora. Possui repertório, possui variação tática, futebol bonito, envolvente, jogadores caros e de muita qualidade e um técnico muito bom. Antes mesmo do 2º jogo da semi-final não havia quem ponderasse a possibilidade do Atlético Mineiro ser eliminado neste jogo.

No entanto, seu adversário, após uma temporada dos sonhos, não conseguia manter a regularidade. Foi eliminado precocemente na Copa do Brasil, perdeu 3 finais e parece improvável que alcance o líder no Campeonato Brasileiro. Em termos futebolísticos, o Palmeiras apresenta um futebol pragmático, muito criticado por “especialistas”, não é bonito e mesmo sendo campeão de tudo na sessão anterior, ainda assim, foi praticamente descartado por todos.

É neste ponto que chegamos a Abel Ferreira, que chegou ao Brasil no dia 30/10/2020. Um improvável técnico para uma agremiação do tamanho da Sociedade Esportiva Palmeiras, que chegou no ano passado para enfrentar o seu primeiro desafio de proporções gigantescas. Desconhecido dos especialistas, da torcida e até mesmo da maioria dos jogadores.

O treinador português chegou com desconfiança em razão do seu retrospecto e em sua primeira entrevista conquistou a todos com respostas inteligentes, simpatia e muito conhecimento em relação à organização Palmeiras. Naquela altura, muitos encaravam como uma atitude desesperada da direção palestrina em virtude dos fracassos nas contratações de treinadores renomados e na implementação de projetos por velhos conhecidos.

Naquela altura o Palmeiras era muito cobrado pelos resultados que entregava, mesmo possuindo a melhor campanha na libertadores. A cobrança da torcida e da mídia especializada era imensa. Entretanto, bastaram poucos jogos e a desesperança passou a dar lugar a um cadinho de confiança.

O Palmeiras passou a realizar grandes jogos, muito seguro na defesa e extremamente mortal no ataque. Abel Ferreira, que não possuía tempo para realizar treinamentos, nem para implementar suas convicções, trabalhou com o que tinha. Se entregou aos jogadores e eles fizeram o mesmo. O resultado disso?

Campeão da libertadores, sendo recordista na história da competição em gols marcados. Campeão da Copa do Brasil. O português passou rapidamente de desconhecido para celebridade e de repente comparações já eram feitas com grandes treinadores do passado e de outras agremiações. O Palmeiras elevou o patamar de cobrança para si próprio a partir dos resultados alcançados.

Entretanto, essa relação começou a estremecer após alguns resultados. A eliminação no Mundial de Clubes, a perda do título para o Flamengo, a perda do título para o pequeno Defensa Y Justícia da Argentina, a perda do Paulistão para o São Paulo, a eliminação para o CRB, a perda da liderança do Campeonato Brasileiro.

Abel Ferreira passou de celebridade, melhor técnico do Brasil para aprendiz de técnico, retranqueiro, enganação, “milongueiro” para a maioria dos comentaristas. Até mesmo alguns torcedores inflamados pediam a cabeça do treinador português.

Todavia, ele perseverou. Mesmo neste cenário, em suas entrevistas, sempre ressaltava a força mental, o autocontrole, a necessidade da união da equipe, necessidade de superarem a si mesmos e reforçava o quanto de trabalho ainda havia por fazer.

Quais são as primeiras lições que podemos tirar daí?

1)   Quem conhece realmente a sua casa e manda nela...é você.

2)   Resultados são importantes, mas são marcadores temporários...

3)   A resiliência é vital em qualquer área. Saber levantar-se após a queda é fundamental

4)   Desesperar-se e entregar-se após algumas tentativas frustradas, não é a melhor opção.

5) Paixão!

6) Prudência

7) Preparo

Mas não é só isso que Abel nos ensina.

Paixões postas de lado, após as críticas e os elogios. O que sobra de Abel Ferreira?

1)   Estabilidade. O treinador está em um dos postos mais cobrados no cenário do futebol nacional. Há muitos anos um treinador não durava 1 temporada inteira na Sociedade Esportiva Palmeiras (e estamos falando de nomes extremamente vitoriosos)

2)   Estabilidade essa conquistada a partir dos resultados obtidos no projeto. Sabe-se quem nem sempre vamos vencer todas as disputas, mas o quanto avançamos em cada uma delas, diz muito sobre o êxito de nosso trabalho. Vejamos o que Abel conquistou em menos de 1 ano:

-Campeão da Libertadores com recorde histórico de gols marcados;

-Finalista da Libertadores novamente com o 2º melhor ataque da competição;

-7º lugar no Campeonato Brasileiro de 2020 (disputando 3 competições ao mesmo tempo e com recorde de partidas disputadas entre os times do mundo inteiro)

-Atual 2º colocado no Campeonato Brasileiro 2021

-Campeão da Copa do Brasil 2020

-Vice-Campeão Paulista

-Vice-Campeão Super Copa do Brasil

-Vice-Campeão da Super Copa das Américas

-4º Colocado no Mundial de Clubes

Para categorizá-lo na mesma prateleira de Felipão, Guardiola, Ferguson, Telê e entre outros grandes nomes do esporte ainda é muito cedo. Mas já não é possível dizer que Abel é apenas um sortudo, um aprendiz de treinador.

Como enfatizado pelo próprio na entrevista coletiva de ontem: “foram 10 anos de preparo para conseguir ser treinador. Foram 10 anos de estudo para estar aqui”.

O Palmeiras hoje tem um padrão de jogo variável, que se ajusta à necessidade do jogo e para os objetivos daquela partida. Tem variação tática, embora o futebol não seja vistoso, do ponto de vista da eficácia, a estratégia é muito boa.

Foi justamente esse forte investimento em estratégia que levou o Palmeiras a mais uma final de Libertadores. Abel teve o grande mérito de reconhecer os pontos fortes de seu time, seus pontos fracos. Identificou as oportunidades que aconteceriam neste jogo de 180 minutos. Identificou as ameaças que o Atlético-MG representa e montou o seu plano de ação.

Defendeu-se com tudo que pôde, contou inclusive com um pouquinho de sorte no primeiro jogo. Atraiu o Atlético no 2º jogo. Quando o time sofreu o ameaçador gol, simplesmente pediu aos seus comandados que tivessem calma e que continuassem a trabalhar, e assim foi feito. Conseguiu o que queria...o gol qualificado.

Quando terminou a partida...ninguém comemorou mais do que o crucificado Abel. Extravasou. Mandou recado para um suposto vizinho, que a meu ver representa toda a imprensa que o vem espetando com lanças afiadas diariamente. Mostrou que o trabalho vence o burburinho. Que a dedicação e o foco podem fazer diferenças brutais.

Que mostrou que jogar para comentaristas ou torcedores apaixonados, nem sempre é a melhor das escolhas. Como nas empresas jogar sempre para os apaixonados e cada vez mais exigentes clientes, pode muitas vezes quebrar um negócio.

Que ter foco em algo mais além e saber onde se quer chegar pode ser a força motriz para enfrentar adversidades do cotidiano. Abel sempre soube o que queria: Montevidéu.

Você como gestor sabe aonde quer chegar? Mais além, você como pessoa sabe aonde quer chegar?

Não se trata de uma fórmula pronta para se obter sucesso ou de conselhos vagos que te trarão prosperidade, riqueza e felicidade.

Trata-se de observar mais além do que é dito e com essa trajetória poder se inspirar, como pode ser feito com tantas outras histórias.

Trata-se de uma singela homenagem à alguém que lutou, sofreu, ganhou, perdeu e mostrou através dos resultados obtidos em sua carreira que não foi sorte, foi trabalho, foi preparo. Que não é mais apenas um aprendiz de treinador, é de fato um treinador. Digno de mais conquistas como estas.

Eu não sei quanto a vocês, mas o abelismo me convenceu.

Vou encerrando por aqui. Enquanto isso: “extravasa, Abel!”

Postado originalmente em: https://www.linkedin.com/pulse/o-que-podemos-aprender-com-abel-ferreira-felipe-benevides