Imunidade de palco: em defesa do Stand Up
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Imunidade de palco: em defesa do Stand Up

O humorista Rodrigo Marques anunciou o recebimento de uma nota de repúdio emitida pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em razão de algumas de suas piadas e...

Wellington
3 min
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O humorista Rodrigo Marques anunciou o recebimento de uma nota de repúdio emitida pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, em razão de algumas de suas piadas envolvendo pessoas portadoras de nanismo.

Houve exposição em seu canal no Youtube (ver aqui).

Curiosamente, o humorista argumentou que o fato de estar no palco e fazer piadas deve ser entendido da mesma forma que uma luta de MMA ou de um filme. Ele tem razão.

O argumento do humorista se aproxima da teoria jurídica da tipicidade conglobante defendida por Raul Zaffaroni. Para quem não se lembra, a teoria defende que não podem ser consideradas ilícitas condutas que, em determinados contextos, são toleradas pelo Estado; por exemplo: lesão corporal (art. 129 CP) x atividade desportiva de artes marciais.

No estudo da liberdade de expressão, há quem eleve a liberdade de expressão artística ao mais alto grau de intocabilidade. Isso se deve ao potencial inimaginável do poder criativo que, invariavelmente, se vale de referências do que existe para dar forma ao que se pode cogitar. Raciocínios hipotéticos, situações de "e se" (ver o filme Bastardos Inglórios ou a série The Man of High Castle) entre outras formas de ficção são resguardadas pela liberdade de expressão artística.

No caso do humoristaé preciso compreender que toda piada sugere a suspensão de veracidade e seriedade do que é falado, o que em tese não deveria ter relevância jurídica.

É importante anotar que todo aquele que aceita ingressar num ambiente onde serão contadas piadas assume o risco de se deparar com algo desagradável. Do mesmo aquele que clica, busca, ouve ou toma conhecimento por qualquer forma, não pode pretender o reconhecimento de que o humorista, no palco, tenha tido a intenção de falar sério.

Embora isso pareça óbvio, dizer que piadas não são coisas sérias é a melhor forma de dizer que aquele que faz piada como forma de trabalho só age com animus jocandi, sem dolo, e em razão do seu ofício.

Cabe dizer que em situações desse tipo, seja envolvendo palavras, ameaças e brincadeiras envolvendo o sumiço de coisas (furto), os tribunais têm analisado caso a caso se o contexto autoriza a conclusão pela incidência do animus jocandi, no que diz respeito ao intuito do agente.

Em se tratando do indivíduo que age no exercício regular de direito (em razão do seu trabalho), entendo que o animus jocandi deve ser presumido, assumindo contornos de imunidade de palco semelhante à imunidade parlamentar daquele que fala da tribuna (art. 53 CF), à imunidade judicial do advogado (art. , § 2º Lei 8906/94), e assim por diante.

A proposta da imunidade de palco confere ao humorista a presunção de legalidade de seus atos, protegendo-o contra achaques de ONG's e outras entidades que visam o cerceamento da liberdade de expressão via instrumentos de tutela coletiva (ação civil pública). É dizer: no palco, o agente é soberano e está resguardado por uma camada que reveste de legalidade suas manifestações; essa camada é como um grande letreiro que diz: não me leve a sério.

Apesar de ultimamente estar na moda o aviltamento às liberdades individuais e imunidades profissionais, se faz necessário um mínimo de segurança jurídica para que uma sociedade vá bem, o que motiva a propositura da reflexão no que diz respeito à ideia da imunidade de palco, para a preservação da liberdade de expressão artística, da livre iniciativa, do direito ao trabalho e para amadurecimento coletivo.