A Loja de Cristais da Srta. Betânia
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A Loja de Cristais da Srta. Betânia

Betânia* era - apesar de nunca ter se casado e preferir ser chamada de senhorita - uma senhora de idade que possuía uma longa loja de cristais grandes e pequenos, era dona de um arsenal inimaginável de pedras preciosas e dizem que ela sempr...

Yuri Adriel
6 min
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Betânia* era - apesar de nunca ter se casado e preferir ser chamada de senhorita - uma senhora de idade que possuía uma loja de cristais grandes e pequenos, era dona de uma variedade inimaginável de pedras preciosas. Reza a lenda que ela sempre oferecia (dado mesmo) a pedra certa para a pessoa certa na ocasião certa, caso você visite a loja dela. Com este intuito, um menino foi à sua loja, em busca de algo que o trouxesse uma nova vista de como poderia levar a vida, vamos chamá-lo de "Yeled"*. Yeled nunca perdeu nada na vida, pois nunca teve o que perder, este era ele; um menino já sem coração, pois nunca aprendeu a ter um; teve seus sentimentos abafados e nunca havia aprendido a amar até então, era este seu objetivo: desfrutar do amor. Betânia o ofereceu um belo colar, com 3 jóias:

Um quartzo rosa- cristal do amor, paz e alegria pela vida

Um quartzo azul- pedra de cura emocional e meditação

Um quartzo fumê- cristal de purificação energética

- Esta é a combinação certa para um menino jovem como você que busca paz em coisas puras como o descobrimento do amor. Com ela, você será inteiramente feliz durante 1 ano. - Diz Betânia.

- Mas eu quero ser feliz para sempre! Não é isto que faz o amor? - Ressalta Yeled

- Escute bem: quando o aprendizado terminar, terá de mostrar que aprendeu, não é? Quando a meia noite tocar, a magia acabará, mas não se acabará o que foi lecionado.

Após isto, Yeled saiu em seu vilarejo para entender qual mudança teria em sua vida, ele acreditava nas palavras da Srta. e buscava entender o que ela havia lhe desejado com o colar.

O tempo passou, e na vila veio a se alojar uma bela moça, chamaremos esta de "Yaldá"*. Com esta bela moça, Yeled descobriu o que seria o amor: o romance de correr entre as margaridas do jardim; admirar sua amada enquanto ela colhia frutas a dar de comer para seus irmãos; ser bem recebido pelos pais da moça que ama, jurar lealdade e fidelidade à família; apoiá-la, amá-la e eternamente adorar ao seu ser. Yaldá, uma jovem ingênua, o aceitou desde a primeira vez que o viu, abraçou seu espírito machucado e o levou a lugares aonde sozinho nunca poderia chegar. "Os sinos da igreja irão tocar! É Yaldá que será para sempre minha amada." afirmava Yeled muitas vezes, quem sabe um dia Yaldá aceitaria, ela mesma sabia que sim.

Era um amor sem defeitos ou imperfeições, todo dia era mágico e preenchia o coração antes vazio de Yeled, assim como a Srta. Betânia afirmou, ele foi inteiramente feliz.

Havia passado 1 ano desde que carregava aquele colar de pedras no pescoço, mas sequer Yeled percebeu pois tamanha era sua felicidade ao descobrir o amor. Conforme os dias foram passando, os dois rapidamente tiveram suas vidas adoçadas com o amor que apenas crescia. Mas os dias iam passando... mais e mais... mais e mais... havia algo de diferente, Yaldá apontava-lhe defeitos constantemente; as brigam não eram tão mais raras; Yeled e Yaldá não viam mais perfeição um no outro; e como nunca pensou que o faria, Yeled a fez chorar, tantas vezes que Yaldá sequer poderia mais contar. Yeled sabia que ainda amava Yaldá, então se perguntava: "Por quê? Por que meus defeitos estão à mostra? Por que me machuco sendo próximo de Yaldá e a amando do mesmo modo que sempre a amei?" Yeled percebeu, Srta. Betânia havia avisado: 1 ano apenas. "Estou perdido! Não posso deixar de Yaldá! Eu a amo! Isto não foi uma benção, e sim uma maldição! Eu, que nunca tive sequer amor fraterno, pude ao menos ter o amor de minha mulher depois de anos buscando felicidade! Então qual o motivo de tal maldição em minha vida?"

Yeled partiu para encontrar-se com Srta. Betânia, a devolveu seu colar, contou sua situação com muito pesar no coração, e logo ouviu em alto e bom tom:

-Meu querido Yeled, pessoas como você que nunca souberam o que significava amor, podem achar que seu romance teve fim e não há volta, mas lembre-se: eu lhe mostrei o amor, seu dever agora é cultivar este amor eternamente no coração de sua amada. Suas dificuldades podem significar inúmeras coisas: problemas de comunicação, medo, orgulho... mas se você se arrepende dos erros que cometeu, sabe que a machuca e quer parar de machucá-la, saiba que seus problemas surgem do desejo de ambos de continuarem juntos e de resolver as situações, lidando com elas não como se fossem contos de fadas mas sim como algo que necessita do cuidado de duas pessoas maduras. Quando lhe dei meu colar queria que entendesse o que é o amor, mas mantê-lo depende de você. Nada é perfeito, e por isso, lute por isso. Peça desculpas, fale, diga o que tiver de dizer, mas não seja injusto, ela também o ama e ela também não quer o perder. Trate-a como um ser humano que necessita de respeito e compreensão, e jamais abuse de suas palavras de forma prepotente. Yaldá não é um brinquedo, não é de ser controlada, não é uma boneca, não nasceu para acrescentar em sua vida, ela acrescenta em sua vida porque quer. Ela lhe faz feliz pois este é o desejo dela, entretanto ela também deseja ser feliz por si própria, entenda isso e verá que o amor que lhe mostrei não foi apenas para você, foi para ela também; eu não a dei de presente à você. Vocês são um casal mas também são duas pessoas separadamente. Meus cristais e pedras não são feitiço, maldição ou benção, mesmo que eu carinhosamente as chame de "mágica", elas são apenas meus instrumentos para atuar neste mundo.

Estas palavras ressoaram na cabeça de Yeled e profundamente adentraram seu coração. Aquele que nunca havia experienciado o amor antes, agora pôde entender. Seu espírito agora sabiamente acatou o ensinamento de Srta. Betânia: sua jovem amada não era conquista alguma, ele ainda haveria de conquistá-la por mais todos os dias de sua vida juntos. Entendê-la, perdoá-la, acalmá-la, ser entendido, ser perdoado, ser acalmado. Yeled estava longe de compreender o amor, mas estava perto de buscar entender Yaldá. Seu amor nunca foi fantasia nem conto de fadas, Yaldá nunca foi sua princesa das tranças de mel, e para Yaldá, Yeled nunca foi seu príncipe do cavalo branco; mas para eles, estava bom. E para Srta. Betânia, esta era apenas mais uma das histórias as quais viveu.

Dedicado a Anna Lia-

*Betânia: nome de descendência hebraica

*Yeled: "menino" em hebraico

*Yaldá: "menina" em hebraico