Ladeira abaixo
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Ladeira abaixo

Henry Galsky
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Sob pressão dos EUA, oficiais israelenses e palestinos se reuniram na Jordânia de modo a buscar caminhos e tomar decisões para impedir o aumento das tensões na região. Mas a realidade segue em paralelo a encontros e cúpulas e, desta forma, dois rapazes judeus que passavam de carro pela cidade palestina de Huwara, próxima a Nablus, foram mortos por um terrorista palestino que os alvejou a curta distância. Para ser claro, foram mortos por serem rapazes judeus passando pela cidade. Simples assim.

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Mas como no conflito entre israelenses e palestinos uma tragédia puxa a outra, na sequência dezenas de colonos judeus na Cisjordânia iniciaram um movimento por vingança, decidindo queimar carros e casas palestinas da cidade. De acordo com a imprensa palestina, cerca de 30 carros e casas locais foram os alvos dos ataques dos colonos.

O exército de Israel passou então a resgatar os moradores palestinos cujas casas foram atingidas.

O descontrole da situação teve as respostas políticas do momento. Na atual coalizão de extrema direita de Israel, não é exatamente uma surpresa que o ministro Bezalel Smotrich (que teoricamente cuida das Finanças, mas que também exerce poder sobre os assentamentos judaicos na Cisjordânia) tenha "curtido" um post no Twitter de seu colega Davidi Ben Zion, vice-prefeito do Conselho Regional da Samária, a região norte da Cisjordânia: "Aqui em Huwara, o sangue de nossos filhos foi derramado na estrada… Huwara precisa ser eliminada hoje. Chega de falar em construir e fortalecer os assentamentos. A dissuasão que foi perdida deve retornar agora, não há espaço para misericórdia”, escreveu.

Huwara é a cidade onde os rapazes judeus foram mortos a tiros. Uma cidade de cerca de 7 mil habitantes. Ben Zion pede que o local seja eliminado. E, como resposta, ganha uma curtida de um ministro de governo. Neste quadro terrível, no país vizinho, oficiais palestinos e israelenses eram pressionados pelos norte-americanos a acalmar os ânimos. Belo exemplo de Smotrich.

Enquanto isso, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu pedia à população para não buscar fazer justiça com as próprias mãos. Tarde demais. A líder do Partido Trabalhista israelense, Merav Michaeli, disse que em Huwara aconteceu um pogrom e chamou os colonos judeus de terroristas que obtêm "legitimidade de membros sêniores deste governo": "Este crescimento cancerígeno que ameaça o país deve ser extirpado o mais rápido possível, antes que nos leve à ruína total", escreveu em sua conta no Twitter.

Netanyahu sempre valorizou sua capacidade de circular nos fóruns internacionais e de defender Israel. Neste mandato atual, parece ter decidido jogar tudo para o espaço, aliando-se a figuras como Ben Gvir e Smotrich. Para se livrar de seus problemas pessoais na Justiça, segue adiante com o projeto de reforma do Judiciário, apesar dos protestos internos, da oposição até de seus eleitores, da desvalorização do shekel, a moeda israelense, da ameaça de isolamento internacional do país e da fuga de empresas de Israel.

Bibi sempre foi um político de direita, mas não de extrema direita. Sempre teve uma visão particular de país, de como ele deveria ser moderno e inserido na comunidade internacional. Neste mandato, está colocando tudo isso a perder, inclusive a própria biografia. A aliança com a extrema direita pode até garantir a sua liberdade e absolvição na Justiça. Mas não garante compreensão interna da sociedade e dos aliados externos. Com a pauta da reforma seguindo seu curso e tendo a seu lado ministros como Smotrich e Ben Gvir, até os EUA perderam a paciência.

As eleições ocorreram em 1 de novembro do ano passado. Em março, o país vive um dos momentos mais decadentes em sua história. É muito pouco tempo para tamanho fracasso.