Rússia se apressa para obter ganhos estratégicos antes de retomar negociações
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Rússia se apressa para obter ganhos estratégicos antes de retomar negociações

Depois de mais de 50 dias de guerra, a operação russa na Ucrânia não está próxima de atingir seus objetivos iniciais - de acordo com o que foi possível compreender do próprio posicionamento e das declarações de Moscou: o que se suponha como o...

Henry Galsky
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Depois de mais de 50 dias de guerra, a operação russa na Ucrânia não está próxima de atingir seus objetivos iniciais - de acordo com o que foi possível compreender do próprio posicionamento e das declarações de Moscou: o que se suponha como ofensiva rápida, ágil e relativamente fácil tem mostrado resultados exatamente opostos.

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Se inicialmente havia inclusive a expectativa de troca de regime na Ucrânia, agora as pretensões russas parecem mais focadas, limitando-se a causar a maior quantidade de dano possível à infraestrutura ucraniana e tendo como princípio algumas metas fundamentais: o reconhecimento da anexação da Crimeia ocorrido em 2014, o compromisso quanto à neutralidade da Ucrânia em relação à OTAN (a aliança militar ocidental liderada pelos EUA), o impedimento da expansão da própria OTAN, e a retenção do controle de parte do Donbas, região no sudeste do território ucraniano em parte já controlada pelos separatistas pró-Rússia.

Os russos tomaram a decisão quanto ao início da guerra. Mas não têm como controlar seus desdobramentos. Um deles é o fortalecimento do presidente Volodymyr Zelensky na comunidade internacional. Os números de civis mortos e a possibilidade inclusive de investigação internacional quanto ao uso de armamento químico pelas forças russas isolam ainda mais o país e seu presidente, Vladimir Putin. Além disso, países oficialmente "não-alinhados", casos de Finlândia e Suécia, interpretam a guerra na Ucrânia como um alerta quanto à própria vulnerabilidade, aproximando-as justamente da OTAN - ou seja, causando efeito reverso ao imaginado pelo governo russo.

Diante da dificuldade do confronto, a Rússia busca agora o que tenho escrito nos textos aqui do site, a chamada "saída honrosa" - se o termo pode ser usado numa guerra, importante dizer. A ofensiva na região de Donbas é o sinal de que esta análise tende a ser correta. Colada à fronteira russa, os custos e complexidades logísticas encolvidos nesta nova etapa da guerra são mais reduzidos, sob o ponto de vista de Moscou.

Essa lógica explicaria também as razões pelas quais os russos praticamente destruíram a pequena cidade de Mariupol, causando inclusive um grande rastro de morte pelo caminho e a possibilidade - ainda a ser investigada, importante dizer - de terem feito uso de armamento químico. O controle de Mariupol permitiria aos militares russos conectar justamente as cidades de Dontetsk e Luhanks - já reconhecidas como independentes pelo governo de Putin - à Crimeia anexada.

"Quando os russos sentirem que concluíram com sucesso essa batalha, eles terão completado uma ponte terrestre da Rússia à Crimeia, (considerando-a) como grande sucesso estratégico", disse à rede BBC o General Sir Richard Barrons - ex-comandante do Comando das Forças Conjuntas do Reino Unido.

No meu texto anterior sobre a guerra na Ucrânia escrevi sobre a sagacidade da equipe do presidente Zelensky durante as negociações com os russos. A ideia era ceder às demandas de Putin quanto à neutralidade do país em relação à OTAN, mas, em paralelo, propondo um mecanismo que praticamente inviabilizaria novas invasões ao território ucraniano. Os russos entenderam a mensagem. E, ao que parece, buscam construir fatos no campo de batalha para, aí sim, fechar algum tipo de acordo nas mesas de negociação.