Imunidade De Impostos Para Entidades Religiosas
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Imunidade De Impostos Para Entidades Religiosas

Disposta pelo artigo 150, inciso VI da Constituição Federal, a imunidade tributária aos templos de qualquer culto garante que qualquer entidade de cunho religioso seja imune a todo tipo de impostos governamentais no Brasil. Tal imunidade não ocorre a

Matheus Gonçalves Vidal
10 min
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1. INTRODUÇÃO

Pois bem, é atribuído aos entes políticos (municípios/estados/Distrito Federal/União) o poder de tributação (Art. 145, CF/88). Referido poder engloba também a possibilidade de conceder imunidades tributárias, eximindo certos grupos de pagarem impostos. No presente estudo, abordaremos a questão de imunidade tributária com organizações religiosas.

Disposta pelo artigo 150, inciso VI da Constituição Federal, a imunidade tributária aos templos de qualquer culto garante que qualquer entidade de cunho religioso seja imune a todo tipo de impostos governamentais no Brasil.

Tal imunidade não ocorre apenas com os templos onde ocorrem cerimônias religiosas, mas abrange também aquelas que trazem renda e serviços relacionados à sua entidade, ou seja, a imunidade se sobrepõe também para aquelas que administram o funcionamento e que garantem recursos para outras entidades.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 DA IMUNIDADE

A imunidade, por seus efeitos, configura-se como uma limitação constitucional ao poder de tributar. Há, ainda, no texto constitucional, outras limitações, como: o princípio da legalidade, da anterioridade, da igualdade, da vedação de confisco, entre outros.

Segundo IVES GANDRA DA SILVA MARTINS:

“A imunidade, portanto, descortina fenômeno de natureza constitucional que retira do poder tributante o poder de tributar sendo, pois, instrumento de política nacional que transcende os limites fenomênicos da tributação ordinária. Nas demais hipóteses desonerativas, sua formulação decorre da mera política tributária de poder público, utilizando-se de mecanismo ofertados pelo Direito. Na imunidade, portanto, há um interesse nacional superior a retirar, do campo de tributação, pessoas, situações, fatos considerados de relevo, enquanto nas demais formas desonerativas há apenas a veiculação de uma política transitória, de índole tributária definida pelo próprio Poder Público, em sua espera de atuação (1998, p.32).”

A imunidade, nas hipóteses constitucionais, constitui o instrumento que o constituinte considerou fundamental para, de um lado, manter a democracia, a liberdade de expressão e ação dos cidadãos e, por outro, de atrair os cidadãos a colaborarem com o Estado, nas suas atividades essenciais, em que, muitas vezes, o próprio Estado atua mal ou insuficientemente, como na educação, saúde, assistência social, entre diversos outros conhecidos pela população em geral.

Importa destacar que as imunidades não têm como objetivo prestigiar qualquer ente ou órgão, mas sim proteger e promover, através de fomentos específicos, determinados valores constitucionais elencados em trechos da Constituição, o que significa dizer que não há privilégio para específicas pessoas físicas ou jurídicas, mas sim, a proteção e a promoção de valores considerados essenciais para a sociedade em geral, a partir de uma visão histórica.

2.2 DOS IMPOSTOS ISENTOS PARA ENTIDADES RELIGIOSAS

Dentre os impostos governamentais isentos a templos de qualquer culto estão: o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto de Renda (IR), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). Cabe ressaltar que para garantir tal direito, a organização religiosa deverá realizar um cadastro e apresentar os documentos para análise perante o Poder Público.

2.3 DA CARACTERIZAÇÃO DE ENTIDADES RELIGIOSAS

Ao delimitarmos a abrangência da imunidade tributária para os templos de qualquer culto é preciso analisar as diversas óticas sobre o que o templo significa na sociedade. Nesse sentido, Eduardo Sabbag informa as três teorias pertinentes:

A primeira, Teoria Clássico-restritiva (Concepção de Templo-coisa), aduz que o templo é onde se realiza a celebração do culto e traz à baila que não somente é o lugar onde se pratica o culto como também é o universitas rerum, o conjunto de coisas em que se pretende realizar o culto que pode ter tanto num imóvel como em uma barcaça.

A segunda, Teoria Clássico-liberal (Concepção de Tempo-atividade), informa que templo é tudo aquilo que de forma direta ou indireta viabiliza a realização do culto, ou seja, é o universitas juris, o conjunto de relações jurídicas que alcançam os direitos e deveres, como por exemplo, a não incidência de IPTU e/ou IPVA sobre, por exemplo, a casa do religioso e o veículo usado exclusivamente para o trabalho eclesiástico. Nessa Teoria é asseverado que se forem utilizados para fins eclesiásticos, quer dizer, relacionados ao templo religioso ou aqueles que praticam serviços sacerdotais, facilitando a realização do culto, não ocorrerá tributação.

E por fim, a terceira, Teoria Moderna (Concepção do Tempo-entidade), afirma ser o templo uma entidade institucional, na forma de organização ou associação, apresentando um sentido jurídico mais amplo pelo fato de ser teorizada em base de organização religiosa incluindo todas as manifestações que caracterizam o culto.

Nesse contexto, há que se tratar também das seitas para a melhor caracterização de templo e culto religioso. Basicamente uma seita consiste em grupo religioso de menor porte e dissidente em relação às doutrinas e dogmas predominantes, que gira em torno de um líder humano.

Ademais, o culto represente o exercício da liberdade de crença como corrobora a seguinte definição: “Culto é uma religião dita não-ortodoxa ou que enfatiza a devoção de acordo com rituais prescritos. [...] sua adoração é um modo de vida, não uma devoção ritualística. Não seguem um humano nem se isolam do resto da sociedade. Vivem e trabalham no meio de outras pessoas”.

Por fim, vale ressaltar que o culto é uma manifestação abstrata, pois não carece de edificações, podendo ser promovidos em terrenos, inclusive ao ar livre, como nas clareiras e montes, por exemplo, conforme a crença e a vontade daqueles que se reúnem para a cultuação.

2.4 DOS BENEFÍCIOS DAS ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS PERANTE A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

Além de não pagarem impostos sobre aluguel de imóveis, bens em nome da entidade e serviços prestados, entidades religiosas também não sofrem tributação. Por exemplo, todo o material adquirido e serviço contratado pela organização religiosa são isentos de impostos.

Como os templos de qualquer culto não são comerciais e se mantêm por meio de doações, a imunidade tributária permite que o valor arrecadado seja utilizado de forma mais ampla, destinando-o para projetos sociais, obras no imóvel, compras de equipamento para cultos, promoção de eventos, e assim por diante.

2.5 DA ARGUMENTAÇÃO A FAVOR DA IMUNIDADE AOS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO

De acordo com o Censo Demográfico de 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 92% da população brasileira segue alguma religião.

As religiões, por sua vez, podem ser consideradas como de interesse social e de função muito importante para a vida de grande parte dos brasileiros.

Além disso, são organizações sem fins lucrativos e que, teoricamente, não comercializam produtos ou vendem serviços, portanto a imunidade de tributação estimula a permanência e expansão de religiões no País.

Do contrário, caso fossem tributadas, boa parte das entidades religiosas sofreriam grandes dificuldades financeiras, o que poderia levar à extinção das mesmas.

Portanto, conforme já supramencionado, a não tributação ou imunidade aos templos de qualquer culto não tem a ideia de trazer nenhum privilégio para aqueles que gozam do referido direito, mas sim, ter como caráter protetivo e também como promoção, através de fomentos específicos, determinados valores constitucionais elencados em trechos da Constituição.

Outro fator importante a favor do direito de imunidade tributária, é a equidade existente entre todas as entidades religiosas. Não há qualquer privilégio tributário para algum templo específico. O direito é igual para todos.

Destaca-se que ao mesmo tempo, onde existam diversos fatores favoráveis à tal imunidade tributária, encontram-se também as argumentações desfavoráveis.

2.6 DA ARGUMENTAÇÃO CONTRA A IMUNIDADE

O Brasil é país laico, respeitado mundialmente pela observância de grande liberdade religiosa e respeito a todas as crenças. Não existe razão que justifique favorecer seus praticantes ou dirigentes com qualquer espécie de favor fiscal.

A tributação tem como objetivos manter os serviços públicos, investir em infraestrutura, saúde, educação, justiça, segurança, etc.

As pessoas que professam uma religião devem arcar com os custos de sua escolha, já que ninguém é obrigado a isso.

De igual forma os adeptos, integrantes ou dirigentes de partidos políticos também o fazem por espírito público e direta ou indiretamente se beneficiam disso.

Uma Sugestão Popular (SUG 2/2015) aberta em 2015 por uma representante da Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos (ATEA) aguarda parecer da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), pedindo o fim da imunidade tributária a entidades religiosas.

O argumento em que a ATEA se baseia é de que “num Estado laico não faz sentido dar imunidade tributária a uma parcela das instituições do Brasil apenas porque são religiosas. Qualquer organização que permita o enriquecimento de seus líderes e membros deve ser tributada.

Além disso, escândalos envolvendo organizações religiosas também motivaram a ação pelo fim da imunidade tributária a templos de qualquer culto. Um exemplo disso foi o caso do Templo de Salomão, sede da Igreja Universal do Reino de Deus em São Paulo, que foi alvo de suspeitas no período em que foi construído. Todo o material utilizado na edificação, principalmente os 40m² de pedra importados, nada sofreu tributação. Devido a essa quantidade, foi considerada a possibilidade de desvio de recursos da obra. No entanto, não houve investigações sobre o caso.

2.7 POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O Supremo Tribunal Federal (STF) vem dando uma interpretação mais extensiva ao instituto da imunidade. O STF vem defendendo uma teoria ampliativa quanto a extensão dos efeitos imunitórios em relação às atividades não essenciais dos templos religiosos. É necessário, analisar a destinação dos recursos obtidos pelo templo, ou seja, havendo relação entre a renda e as finalidades essenciais, deve-se aplicar o dispositivo constitucional.

Segundo o entendimento do STF, os imóveis de propriedade de entidade religiosa, embora alugados, isto é, não aplicados diretamente na prática do culto religioso, estarão alcançados pela imunidade tributária se os rendimentos dos aluguéis forem destinados às finalidades essenciais da entidade religiosa.

Ao invés de interpretar a imunidade tributária sob uma visão estrutural (onde o importante é natureza do bem, do rendimento ou manifestação de capacidade contributiva), adotou o STF uma interpretação funcional da norma constitucional imunizante, onde o ponto central reside na destinação da renda ou do bem às finalidades essenciais da entidade religiosa.

Por fim, cabe destacar que nos últimos cinco anos houve uma ampla renovação pela qual passou a composição do STF. Por isso é interessante se verificar se o posicionamento da Suprema Corte será ou não modificado em consonância aos novos integrantes da mesma, haja visto ser uma questão de grande interesse social, pela relevância que as entidades religiosas assumiram, hodiernamente.

3. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, conclui-se que a imunidade é uma limitação constitucional ao poder de tributar, uma vez que está contida de forma expressa pela CF/88. Logo, a pessoa ou a instituição contemplada não podem sofrer tributação, haja vista ser um direito público subjetivo concedido as mesmas.

Referida imunidade encontra-se presente no artigo 150, IV, b, CF/88, abrange apenas os impostos, não alcançando as taxas, contribuições de melhoria e contribuições sociais ou para-fiscais. Esta tal imunidade adstrita ao patrimônio, renda e serviços ligados à atividade fim das entidades, perdendo a imunidade sempre que houver desvirtuamento da atividade fim.

Importante ressaltar que o STF mudou seu posicionamento ao longo das décadas passadas e vem dando uma interpretação mais ampla ao instituto da imunidade. Desse modo, a Corte Suprema defende, atualmente, uma teoria ampliativa quanto à extensão dos efeitos imunitários a atividades essenciais da Igreja.

Por fim, é necessário ressaltar que outros estudos devem ser feitos com relação a tal assunto, com intuito de melhor se debater e aperfeiçoar o assunto face ao constante desenvolvimento que a sociedade sempre passa face a mudança e reestruturação de certos valores. A nova composição do STF pode contribuir perfeitamente para uma maior discursividade e melhor exegese do tema, haja vista a importância das entidades religiosas na sociedade brasileira frente as suas atividades essenciais.

4. REFERÊNCIAS

- SILVA, Ricardo. A Imunidade dos Templos de Qualquer Culto.

- MARTINS, Ives Gandra da Silva. Imunidades Tributárias. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: Centro de Extensão Universitária, 1998.

- BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

- Carvalho, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 13. Ed. São Paulo: Saraiva, 2000.

- https://www.conjur.com.br/2016-mar-28/justiça-tributária-bem-pais-imunidades-fiscais-revistas

- https://flavioportodasilva.jusbrasil.com.br/artigos/206896275/imunidade-tributária-de-templos-religiosos