Realizada profissionalmente no Catar desde 1972, a corrida de camelos remonta à Idade Média e movimenta um mercado milionário. Embora essa prática seja comum, ela flerta com a violação dos direitos dos animais e dos direitos humanos.
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Realizada profissionalmente no Catar desde 1972, a corrida de camelos remonta à Idade Média e movimenta um mercado milionário. Embora essa prática seja comum, ela flerta com a violação dos direitos dos animais e dos direitos humanos. | ||
É sexta-feira, dia de descanso e fé para os países muçulmanos. A temporada de corridas de outubro a março também é a época de grandes competições nacionais e internacionais na pista de Al Shahaniya, principal centro de corridas do país. Desta vez, por conta da Copa do Mundo de futebol nas cidades vizinhas, optou-se por ocupar parte do espaço com festividades e aproveitar a presença de turistas de diversas partes do mundo. As disputas foram transferidas para outras datas, mas os treinos continuam pela manhã e à tarde, com acesso livre para torcedores e espectadores. | ||
"Achei que ia ter corrida hoje, mas tudo bem. Pude ver o treino, fazer uns vídeos muito bonitos. Nunca vi nada assim", diz Óscar Muñoz, turista uruguaio que aproveitou o dia sem jogos da seleção da Copa do Mundo a visitar um local que fica a menos de uma hora de Doha. Animado, ele pisa no chão e desvia do esterco para se aproximar dos animais, que calmamente entram na aldeia, lar de cerca de 20.000 camelos.10 | ||
À direita, uma placa alerta os motoristas que alinham cuidadosamente seus veículos e aguardam a vez de atravessar a rodovia. Centenas de camelos gradualmente tomam conta da paisagem desértica de Al Shahaniya sob o sol das 15h que logo se aproxima do horizonte. Conduzidos por ônibus, eles atravessam o asfalto quente na frente dos carros e seguem para a estrada de terra. A menos de 40 quilômetros de distância, no novíssimo Estádio Al Thumama, o anfitrião Catar se preparava para a decisão da Copa do Mundo contra o Senegal. Mas aqui o foco está em um esporte mais tradicional. | ||
As corridas de camelo começaram profissionalmente no Catar em 1972, mas suas origens remontam à Idade Média. Os historiadores apontam que os primeiros eventos aconteceram no século VII na Península Arábica como forma de entreter as elites locais em casamentos, comemorações e outros encontros festivos. A tradição perdurou por séculos, popularizou-se e adquiriu novos contornos competitivos, tecnológicos e financeiros. | ||
"Está sempre lotado durante os torneios. Gente do mundo todo vem conhecer e tirar fotos. É um dos passeios que mais faço", diz o motorista e guia Sharif, 43, que nasceu na Índia, mas mora em Doha há 18 anos "É um esporte tradicional que impressiona a família do emir Tamim bin Hamad Al Thani", acrescenta, referindo-se ao xeque do Catar. | ||
O mercado esportivo do Oriente Médio é milionário. Os preços variam de lugar para lugar, mas os camelos mais baratos costumam custar U$ 50.000 (cerca de R$ 270.000 a preços atuais). Mais procurados, os "puros-sangues" ultrapassam a marca do milhão. Em 2010, um saudita pagou a impressionante quantia de US$ 9,45 milhões (mais de R$ 51 milhões hoje) para comprar três animais. Os campeões, por outro lado, podem chegar a um preço de U$ 30 milhões (R$ 162 milhões). | ||
Apostar em corridas de camelos não é permitido no mercado oficial. Os prêmios para os vencedores do campeonato variam de SUVs novinhos em folha a itens que simbolizam o folclore local, como facas, espadas e até lanças. Nos eventos mais importantes, o prêmio é em dinheiro. Competições recentes dividiram 10 milhões de riais do Catar (cerca de R$ 14,8 milhões) entre os três primeiros colocados em uma disputa de 15 rodadas. | ||
Nas corridas, os principais competidores atingem em sua maioria sprints curtos de quase 70 quilômetros por hora, e em provas mais longas conseguem manter 50 quilômetros por hora durante 60 minutos. As estratégias para aumentar a velocidade passam pelo treinamento, alimentação e quem controla os animais. Durante muito tempo, as crianças foram usadas como jóqueis porque pesam menos que os adultos. A prática foi duramente criticada até ser abolida em 2005. | ||
Os competidores decidiram substituir as crianças por pequenos robôs, colocados nas corcundas de camelos e simulando os movimentos e orientação de jóqueis humanos. Fora dos trilhos, os ônibus controlam o funcionamento da máquina em uma dinâmica que geralmente funciona de acordo com o planejado. Existem diversos modelos de robôs, com preços que variam de U$ 300 a U$ 10.000 (R$ 1.600 a R$ 541.000), dependendo do peso e da qualidade. | ||
O método mais tradicional de assistir às corridas é de carro. Paralelamente às trilhas dos animais, há três pistas de pista pavimentada cheias de carros de campeonato de alta velocidade. Nos dias de treino, os homens montam nos pilotos e os conduzem até o fim, enquanto os milionários donos de camelos os acompanham em belos modelos SUV e lideram a equipe. |