Ele não pode subir a rampa
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Ele não pode subir a rampa

Não é hora de parar. Se você se decepcionou com o relatório das Forças Armadas, no primeiro momento eu também me decepcionei, confesso. Mas, parei para pensar.

HS Naddeo
11 min
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Não é hora de parar. Se você se decepcionou com o relatório das Forças Armadas, no primeiro momento eu também me decepcionei, confesso. Mas, parei para pensar. Reli muitas coisas de ontem para hoje, repensei muitas ideias e entendimentos, reli o próprio relatório mais de uma vez, revi trechos de alguns vídeos e textos, e percebi que minha primeira impressão sobre o conteúdo do relatório estava mais ligada a uma sensação de derrotismo, talvez por ter visto Lula em Brasília se reunindo com as cúpulas dos poderes e entendido sua eleição como fato consumado, ou talvez por ter ingenuamente imaginado, e até exigido, que a apresentação do relatório seria sucedida por uma ação imediata dos militares. Mas eu estava errado. A explanação dos militares em momento algum dá razão ao TSE ou avaliza o resultado das eleições, pelo contrário. O relatório suscita dúvidas sérias que exigem esclarecimentos urgentes. Não depois da posse ou no mês que vem. Urgentes, para ontem. E o recado explícito das entrelinhas não nos desmotiva ou insinua que devemos ir para casa e esperar a boa vontade do TSE. O entendimento correto é que os militares têm as mesmas dúvidas (ou certezas, ditas de maneira técnica) que nós, o que faz da nossa permanente presença nas ruas um fator ainda mais importante e significativo para que a força desse relatório não fique expressa apenas em palavras e sentimentos, mas em atitudes que, estas sim, podem impactar na resolução dessa situação em que vivemos. Então, te convido a ler as linhas abaixo, esperando contribuir para o entendimento do que é que realmente estamos vivendo e como chegamos até aqui.

Somos, de fato, um povo incomum na superfície desse planeta, um povo privilegiado pelo território que ocupa, pelo sol abundante, pelas quantidade de terras férteis, por uma das maiores bacias hidrográficas e dois dos maiores aquíferos que se têm conhecimento, pelas infinitas riquezas do nosso solo, pela biodiversidade invejada e única no planeta, livres das calamidades naturais que assolam tantos países. Somos acolhedores, alegres, empáticos, batalhadores, uma capacidade ímpar de rir da própria desgraça, admirados pelo mundo por tudo isso, pelo nosso futebol, pelo nosso carnaval, pela maneira quase subalterna que recebemos nossos visitantes estrangeiros que, por tudo isso, invariavelmente se apaixona pelo Brasil e pelo jeito do brasileiro. Somos os país onde quase todo mundo gostaria de morar. Pelos muitos lugares por onde já andei, ao dizer que sou brasileiro, ganhei sorrisos, simpatia, atenção, de gente que mal sabe sobre nós, além do futebol ou carnaval, mas que faz desse pouco o suficiente para nos enxergar como realmente somos enquanto povo. O que eles não sabem, nada, é o que somos como nação.

O Brasil tem todos os elementos necessários para ser uma potência mundial, se não maior, no mínimo, igual a qualquer outra. Nenhum país tem reunido em seu subsolo tantas riquezas minerais quanto nós, de metais essenciais à quaisquer industrias de qualquer segmento à construção civil; petróleo, ouro, pedras preciosas, o quase monopólio das reservas de nióbio e a quantidade imensurável de grafeno, que promete ser uma das commodities mais inovadoras deste milênio. A Amazônia, que representa 60% do nosso território, não é cobiçada por mero acaso. Lá fora, quem conhece o potencial dessa gigantesca área não está interessado na preservação do ar do planeta, dos povos indígenas ou dos animais. Eles querem o controle dos tesouros da floresta, e como não é mais possível fazer como faziam 500 anos atrás, simplesmente invadindo, conquistando e saqueando países e regiões, hoje eles travestem suas intenções através de falsos discursos climáticos e humanitários, financiando milhares de ONGs que, por debaixo dos panos, praticam da subversão ideológica ao tráfico de madeira, minerais, pedras preciosas e até de crianças e adultos. Temos de tudo, e quem nunca saiu do Brasil, mesmo que seja bem informado, não consegue fazer o contraponto com o que existe lá fora, ou melhor, não existe lá fora e tem de sobra por aqui.

Só quem não sabe valorizar o Brasil pelo que ele é são os brasileiros. Diria que não é coincidência que os estrangeiros saibam de nós muito pouco além de carnaval e futebol, porque o grosso da nossa população também sabe pouco mais do que isso. Somos acolhedores, alegres, empáticos, batalhadores, uma capacidade ímpar de rir da própria desgraça, mas com uma grande dificuldade de transformar isso em benefício próprio. Acolhemos os estrangeiros como reis, mas não acolhemos os próprios brasileiros como irmãos. Somos alegres demais, inclusive nos momentos em que deveríamos estar tristes, apreensivos ou revoltados com os tantos prejuízos causados às nossas vidas por sucessivos governantes que só nos lesaram, a ponto de reelegermos para presidente uma pessoa que, comprovadamente, causou danos irreparáveis ao nosso futuro. Somos empáticos na dor, na doença, na desgraça alheia, mas com imensas dificuldades para mostrar empatia na hora de uma luta que é de todos nós. Somos batalhadores, sim, mas nos falta noção de coletividade quando a batalha não gera ganho individual. Rimos da nossa própria desgraça, mas, em geral, pouco fazemos para evitar que as desgraças aconteçam, talvez com medo de não ter do que rir depois. E se os estrangeiros pouco sabem de nós como nação, nós também pouco sabemos. Os portugueses descobriram o Brasil em 1500, nós ainda estamos nos descobrindo.

Ao contrário dos países vizinhos, cuja maioria precisou lutar para se independer de seus colonizadores, nós não passamos por isso. Fomos libertos por um português, sem luta, sem batalhas regadas à sangue inocente, sem revoltas e rebeliões para que isso acontecesse. Brigamos para expulsar franceses, holandeses, mas fizemos isso ao lado dos portugueses. Contra eles a briga foi travada simploriamente por carta, e eles só reclamaram. Houve conflitos na nossa história, sim, mas nada que tivesse impregnado a alma do brasileiro como aconteceu com os povos que tiveram que se livrar dos espanhóis na base da porrada. Como povo, pouco brigamos. Aconteceram brigas importantes, sim, mas quase sempre resolvidas em pouco tempo, e jamais capazes de nos dividir como povo brasileiro, mesmo quando alguns quiseram deixar de sê-lo. O fato é que não aprendemos a brigar pelo nosso país, pela nossa cidadania, pelos nossos direitos. Durante uma parte da história foi o exército português que cuidou disso. De lá para cá, nosso próprio exército sempre esteve à frente quando foi necessário, e podemos colocar nessa conta 1964, quando o clamor do povo pediu que eles resolvessem o problema.

Por um bom tempo, pensávamos que ele tinham resolvido. A ascensão da esquerda ao poder em 2003, com um discurso moderno voltado para o social, não levantou suspeitas do que pretendiam a longo prazo. Por mais que as figuras que protagonizavam a cena política fossem originárias do movimento guerrilheiro da década de 1969, as ações indicavam atitudes condizentes com a democracia, com o capitalismo. Foi preciso que os gigantescos e sucessivos escândalos fossem sendo revelados um a um para entendermos que se tratava de uma quadrilha que financiava ditaduras estrangeiras com o nosso dinheiro, além de roubarem para si mesmos. E mesmo assim, focamos no roubo, no comportamento quadrilheiro, e esquecemos de observar tudo o que realmente estava por trás disso, e o que teria sido do Brasil se eles tivessem se mantido no poder. E tudo aconteceu, mais uma vez, sem que nós, povo, tivéssemos nos envolvido em algum tipo de luta. Nos manifestamos, aos milhões, mas, novamente, não foi pelas nossas mãos que o sistema foi derrotado naquele momento, quem fez isso foi a justiça.

Porém, a justiça não teve a força necessária para dilacerar o núcleo da corrupção que tomou conta das nossas instituições. E dessa vez, de maneira fraudulenta (e talvez das outras vezes também), com todo o apoio do sistema, desde a campanha avisaram o que fariam se voltassem. E voltaram, fazendo deste momento da nossa história a primeira vez que somos conclamados para a luta, que começou pelo apelo às Forças Armadas, para que, novamente, resolvam nossos problemas, mas que tem enormes chances de exigir muito mais de nós, o que não significa que teremos que, necessariamente, pegar em armas, mas usar de outras "armas" para chegarmos ao resultado esperado. Precisamos entender que é o nosso dinheiro, o produto do nosso trabalho que sustenta a ousadia e a ganância desses poderosos. Enquanto continuarmos produzindo e gerando impostos, garantimos as lagostas, vinhos importados e ternos bem cortados de quem nos oprime. O sistema precisa de dinheiro para sobreviver, nós também. Mas ao produzirmos nosso dinheiro, automaticamente, produzimos o dinheiro deles, e isso também envolve o conforto dos generais, almirantes, brigadeiros e coronéis que estão vacilantes sobre agir ou não agir, mesmo sabendo que estão sob a ameça de ter suas instituições sob controle destes comunistas que já avisaram que pretendem reduzir seus poderes e importância dentro da república.

Autoridades só existem quando são reconhecidas pela população como tal. Somos nós que garantimos sua importância e relevância dentro da estrutura do estado, e esse nós não implica apenas no povo. Em todas as instituições existem pessoas que obedecem ordens de cima par baixo, e que têm obedecido ordens sabidamente inconstitucionais e ilegais nos últimos tempos, muitos por entender cegamente que devem obedecer a questão hierárquica, outros por que fazem parte do sistema corrompido e usam a força de seus cargos para garantir privilégios e obter mais benefícios por serem defensores da causa comunista. Não temos que brigar com estas pessoas. Temos que convencê-las, individualmente, mediante ao acesso que cada um de nós tem a uma parcela destes grupos. É trabalho ingrato, de formiguinha, que se não as fizerem aderir à nossa luta, que pelo menos as façam entender o porquê estamos lutando. Não importa o cargo, não importa o tipo e a cor da farda, são todos seres humanos que têm famílias, que não estão protegidas do que pode acontecer no Brasil nem por cargos, nem por fardas.

São duas as vias que podem levar à ruptura do sistema, a porrada e a ruptura do fluxo financeiro. Não existe hipótese de que essa situação seja resolvida por via democrática, diplomática ou por conversas de bastidores, essa é a verdade, e quem olhar artigos meus de anos atrás, antes mesmo da eleição de Bolsonaro, verá que eu já dizia isso, usando essa mesma sequência de palavras. O sistema não conhece o diálogo, só conhece a força, que, por enquanto vem sido exercida através das canetadas, porque Lula já avisou o que pretende, já mostrou que sua receita de governo é igual a que foi usada na Venezuela, Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Bolívia, Peru e Nicarágua. E antes mesmo das eleições já vivíamos sob o cerceamento das nossas liberdades, censura, que apertou ainda mais durante o processo eleitoral e que, perigosamente, não se encerrou depois dele. E o que vem depois é o que eu escrevi no artigo "Desarmamento, censura e tortura", que você pode ler clicando no link, e que é o que já acontece em alguns dos países que citei acima.

Não existe vitória sem luta, luta sem causa, e causa sem um fator justo que a motive. Temos motivos de sobra, o que faz da nossa causa robusta, defensável e justifica nossa luta. E lembro aqui a fala do jornalista Carlos Lacerda, opositor ferrenho de Getúlio Vargas, que, durante a campanha eleitoral que levou Getúlio ao poder novamente, através de eleições em 1950, disse "O Senhor Getúlio não deve ser candidato, se for candidato não deve ser eleito, se for eleito, não deve tomar posse, se tomar posse não pode governar”. Getúlio foi candidato, foi eleito, tomou posse e governou até cometer suicídio. Já deixamos Lula ser candidato e ser eleito. Não podemos aceitar e deixar que tome posse. Acontecendo, ninguém o impedirá de governar. Governando, será o suicídio da nossa democracia, de uma nação que não soube evitar que tudo isso acontecesse. Se Lula subir a rampa, já era.


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