A cena final do filme “Eu sou a Lenda”, protagonizado por Will Smith, é uma das mais tocantes do cinema moderno.
A cena final do filme “Eu sou a Lenda”, protagonizado por Will Smith, é uma das mais tocantes do cinema moderno. | ||
É preciso entender o contexto em que ela se dá e a evolução cronológica de todo o seu sentido. Além de ter um espírito que aceite a fé e a crença como explicações possíveis para os eventos cotidianos. | ||
Robert Neville é um cientista que busca a cura para um vírus que coloca a humanidade em risco. Se negando a abandonar a cidade onde vive, a qual enxerga como seu “marco zero”, acredita que pode reverter a situação e salvar as pessoas infectadas. Numa tentativa frustrada de evacuação aérea de sua família, ele vê o helicóptero se chocar em outro e provocar a morte de sua mulher e de sua filha, que deixou a ele a companhia de Sam, um pastor alemão fêmea. | ||
Durante toda a trama, Dr. Neville encontra em Sam a lembrança de sua família e o resquício de humanidade que lhe mantém num mundo pós-apocalíptico. A relação construída entre os dois é profunda e marcante, um comprometimento mútuo de cuidado, proteção e amor. | ||
Sam é a esperança que ressoa no coração de Robert Neville de que a vida pode voltar a ser o que era, mesmo que isso seja uma lembrança já distante e confusa. | ||
Não por acaso, a morte de Sam é a desistência de Neville. O último fio de sanidade que lhe fazia seguir se esvai. | ||
No momento de maior desesperança, onde um homem cético se vê entregue ao destino cruel que se lhe abateu, surge (através da luz) a salvação de sua alma. | ||
Anna Montez, personagem interpretada pela brasileira Alice Braga, resgata o quase acabado Robert Neville, que se lançava num último ato de desespero, levando-o de volta pra casa. | ||
Anna e o filho substituem a lembrança da família que o solitário doutor projetava em Sam. Confuso e atordoado, ele tenta entender como os dois foram parar ali. A moça lhe explica que partiram de um navio em São Paulo, que teria como destino uma colônia de sobreviventes, mas que acabou por ser atacado pelas pessoas infectadas pelo vírus, interrompendo o trajeto. | ||
Diante disso, Neville afirma inexistir a colônia de sobreviventes, que os planos de evacuação não resultaram como era esperado. Anna o confronta dizendo que as colônias existem, pois ela sabe disso. Questionada pelo doutor de como ela poderia saber, responde de maneira enfática: “Deus me contou”. | ||
Nesse momento, Robert Neville demonstra desprezo pela fé que Anna diz ter e debocha da possibilidade de Deus (O Deus) ter falado com ela. Anna tenta mostrar que todo o caminho que a levou até ali, fazendo com que fosse possível salvá-lo, não poderia ser apenas coincidência. Ela, então, vaticina: “o mundo está mais silencioso agora, você só precisa escutar. Se você escutar, poderá ouvir os planos de Deus”. | ||
O doutor se enfurece ao ser chamado para vislumbrar tal absurdo. Ele a explica os planos de Deus através de uma visão científica de todo o impacto causado pelo vírus, vociferando uma torrente de estatísticas quanto à mortalidade provocada e terminando por afirmar aos berros: “todas as pessoas que você ou eu conhecemos morreram. Morreram! Deus não existe. Deus não existe”. | ||
No instante em que encerra a sua fala, Neville percebe que as pessoas infectadas os seguiram até ali. Após não conseguir conter o avanço por meio das bombas disparadas no parque em frente de sua casa, precisa lutar com um dos infectados até conseguir se desvencilhar e levar Anna e o filho para seu laboratório. | ||
Momento em que os três se surpreendem. Uma das cobaias que o cientista usava para testar a cura finalmente apresenta melhora. Está conseguindo conter o vírus e retornar ao estado natural, saudável. | ||
O laboratório, então, é invadido pelos outros infectados e o doutor fecha a sala de vidro em que se encontram. Enquanto a sala é atacada, Neville grita pedindo que parem, pois ele pode salvá-los. Tenta, em vão, explicar que estão doentes e que ele pode ajudá-los. | ||
Os infectados seguem atacando a porta de vidro, que vai se trincando aos poucos e formando, aos olhos do doutor, o desenho de uma borboleta. | ||
Como se absorvido por essa visão, ele ouve a voz de sua filha, que, momentos antes de morrer, havia feito um desenho no vidro do helicóptero e dito: “papai, olhe: é uma borboleta”. Algo o faz olhar para Anna, ao chão abraçada com seu filho, tendo no pescoço a tatuagem de uma borboleta. | ||
Ele, então, sai do estado de absorção e age rapidamente, retira o sangue da cobaia, entrega o recipiente à Anna, enquanto abriga ela e o filho num bunker, dizendo: “creio que é por isso que você está aqui”. A moça não entende a atitude de Neville e pergunta o que ele está fazendo, ele responde de maneira resoluta: “eu estou ouvindo”, numa clara alusão ao chamado de Ana para os planos de Deus. | ||
Robert Neville encontra, assim, o sentido de sua vida, que parecia enterrado na descrença. Ele foi capaz de abrir seu espírito e permitir o contato com o Criador. O mesmo Deus do qual ele duvidou, se fez presente em seu coração no momento derradeiro. | ||
A sua morte é a redenção. | ||
“Nós- a humanidade- somos seu legado. Essa é a sua lenda. Uma luz na escuridão”: as palavras usadas ao final do filme para definir Robert Neville, em verdade, nos remetem a Jesus Cristo. | ||
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