Esqueça Home-Office, o futuro é Anywhere-Office!
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Esqueça Home-Office, o futuro é Anywhere-Office!

Victor Maia06/21/2020
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Nos últimos dois meses o que mais temos visto de discussão é a relação de trabalho nas empresas. Após termos que assumir a condição de home-office obrigatório devido a pandemia, muitas empresas perceberam que, muito do que acreditavam ser barreiras para utilização de modelo de trabalho remoto, caiu por terra e agora temos condições mais que necessárias para trabalhar de qualquer lugar que desejarmos.

Por coincidência, nesse mesmo período li um livro que há alguns anos estava na minha lista de leitura. O livro Remote: Office Not Required foi escrito por Jason Fried e David Hanson, fundadores da 37signals - atual Basecamp - e que já haviam escrito um outro livro essencial para os dias modernos de trabalho, o Rework.

As vezes a sensação do Home-Office é exatamente essa, em especial durante a quarentena.
As vezes a sensação do Home-Office é exatamente essa, em especial durante a quarentena.

A verdade que é ainda não podemos bater muitos martelos em relação ao trabalho remoto, em especial ao home-office, afinal durante a pandemia há também um medo generalizado por parte dos colaboradores de perderem seus empregos, e o que isso pode causar? Bem, em uma análise superficial, o sub-produto desse sentimento é apenas um: as pessoas querem mostrar serviço, produtividade e efetividade. Sendo assim, podemos estar vivendo uma distorção real das condições de trabalho devido ao COVID-19.

Mas se você me perguntar se acredito piamente nisso, afirmarei que sou contra essa teoria. Mas veja bem, não negarei a possibilidade, afinal ela é real!

Me posiciono contra dessa teoria pelo fato de que, mesmo vivendo um momento de distorções, o mundo corporativo já vinha carregando essa discussão sobre trabalho remoto à anos, empresas como a Basecamp são advogados da bandeira do trabalho remoto a pelo menos 10 anos, uma década. Mas vejo que a discussão continua ainda nos mesmos pilares, sempre envolvendo os problemas de construção de cultura, gerenciamento de times e claro, a conversa de corredor durante o cafezinho.

Foi após engajar em uma conversa com a autora Cristiane Correa no LinkedIn que fui convidado pela coluna Mundo Business para falar um pouco sobre minha visão em relação ao home-office, ou como prefiro chamar anywhere office. Para colaborar com a discussão, é importante que assista também o TED do fundador do Wordpress, Matt Mullenweg, em que eles expõe as melhores práticas que levaram a Automattic a ter uma força de trabalho de mais de 800 pessoas espalhadas por todo mundo.

Apenas para juntar alguns casos famosos ao time do trabalho remoto, temos a Automattic - dona do Wordpress, JetPack e WooCommerce - com mais de 800 colaboradores distribuídos pelo mundo, temos a Basecamp, que apesar de pequena, possui aproximadamente 100 colaboradores distribuídos em diversos locais do mundo e também temos alguns outros casos que começaram as despontar com o estouro da quarentena pelo mundo, como é o caso da Webflow.

Um caso real, que aconteceu comigo

Nem sempre fui tão defensor do trabalho remoto, ou como o fundador do Wordpress chama, trabalho distribuído.

Quando tive minha empresa, sempre preferi que o trabalho fosse realizado com todo o time alocado no escritório. A verdade é que uma série de coisas eram motivo para isso, a principal delas sempre foi a linha de custo fixo do escritório no orçamento; se você somar todos os custos de estrutura como obras, manutenção, internet, telefone fixo, luz e outros; você ficará cada vez mais tentado a manter a sua estrutura local funcionando e com todos os seus colaboradores trabalhando de um mesmo local.

Para um nano-empresário como eu era, cada dia alguém do time trabalhava longe do escritório era uma dor mais profunda no meu bolso. No entanto sempre dei a opção de trabalhar de casa quando necessário, desde que seguissem algumas regras básicas como comunicar com antecedência e claro focar suas comunicações pelo Slack (comunicador interno que utilizava na empresa).

O que notava era que sempre que havia um caso de algum colaborador trabalhando de casa ou remoto era um dos dois cenários:

  1. A pessoa atingia um pico de produtividade e não deixava quase nenhuma pendência se em comparação quando no escritório;
  2. A percepção era que o trabalho remoto, ou de casa, era uma desculpa para se trabalhar menos ou menos eficiente;

A verdade é que para mim, enquanto gestor, a opção número 1 era na minoria das vezes. Aos poucos fui percebendo que o meu problema circulava em relação de confiança e claro, maturidade com a equipe.

Lições valiosas do Remote: Office Not Required

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Ao ler o livro parece que todas as experiências profissionais com o trabalho remoto convergiram para "abrir minha mente".

Pare e pense, onde somos mais produtivos e podemos trabalhar mais focados? Geralmente longe do escritório, não é atoa que diversas vezes chegamos mais cedo ou saímos mais tarde do escritório; ou até mesmo vamos ao aos finais de semana para o escritório? Para quem?! Para realizar um trabalho focado, longe de distrações.

Tente se lembrar, quantas vezes você foi interrompido dentro do escritório? Quantas vezes um colega te cutucava para pedir uma ajuda e assim interrompendo uma linha de raciocínio que você estava focado? Aposto que inúmeras vezes e não falo isso por ser chato, é estatística e ciência que comprovam que cada interrupção gera uma perda enorme de produtividade individual.

Um estudo da Universidade da Califórnia, Irvine descobriu que são necessários em média 23 minutos e 15 segundos para voltar aos trilhos após ser interrompido. Isso significa que, mesmo que você tenha a sorte de se distrair apenas algumas vezes por dia, perde uma hora de trabalho!

Outro ponto relevante para sua empresa adotar o trabalho remoto ou distribuído após a pandemia: recrutamento e talento.

Empresas que são remotas ou pensam de forma a ter o seu trabalho distribuído não se prendem a recrutar apenas pessoas no local em que a empresa está localizada, nem mesmo precisam criar programas mirabolantes para convencer alguém a se mudar. A verdade é uma só: talento é possível de se encontrar em qualquer parte do mundo e se você se limita a contratar apenas quem mora na mesma cidade que você, você está limitando significativamente as capacidades da sua empresa.

Vejo isso pela experiência com o Team GaryVee Brazil. Hoje a equipe é formada por falantes nativos de português e que também são fluentes em inglês, no entanto, apenas 20% do time é residente no Brasil. Temos pessoas que moram no Canadá, Estados Unidos e Austrália; afinal, por que deveríamos limitar apenas ao Brasil sendo que há pessoas talentosas e com vontade espalhadas por diversas partes do globo?

Mas atenção, contratar pessoas espalhadas no globo exige um cuidado especial - que na minha visão deveria ser um cuidado até para quando você está contratando pessoas alocadas em seu escritório.

Não é porque o seu modelo é remoto que você vai pagar menos para sua equipe. Lembre-se, você está concorrendo com empresas de todo globo e talento é algo que devemos segurar com todos os artifícios possíveis. Logo, ofereça remunerações adequadas, mesmo se sua empresa está localizada em uma pequena cidade do interior...busque oferecer remunerações que:

  1. Cubram as expectativas da pessoa do outro lado;
  2. Seja o suficiente para que o talento dessa pessoa trabalhe focado, sem olhar para os lados;
  3. Cumpra com o níveis de qualidade do trabalho desejado;

Lembre-se, você está economizando com estrutura física para poder melhorar as outras condições gerais para a equipe realizar cada vez mais um trabalho mais produtivo!

Tudo é um trade-off

Lembre-se que nem tudo são flores e trabalhar nesse modelo exige disciplina e dedicação, tanto por parte da empresa, quanto por parte do colaborador!

Sim, é importante que a empresa forneça os instrumentos corretos para que as equipes possam performa na melhor forma possível. Quando digo isso, não é apenas em relação à ferramentas como Trello, Jira, Asana ou ClickUp para gerir tarefas; Meet, Zoom ou Whereby para vídeo-chamadas ou Miro para colaboração em tempo real. Não é isso!

A empresa precisa ter processos estruturados, boa documentação das tomadas de decisão, histórico de projetos e resultados. Ter uma estrutura e rituais claros!

Enquanto, pelo lado do colaborador é preciso entender que ele está ganhando liberdade e controle sobre seu (ambiente de) trabalho; logo, como diria o Tio Ben em O Homem-Aranha "grandes poderes trazem grandes responsabilidades." É preciso estar preparado para cobranças mais duras e diretas e acabar com a cultura de "passar a mão na cabeça". Todos os colaboradores são adultos e precisam ser tratados como tais; seja para cobrar, seja para congratular!

Outro item importante é em relação à fusos horários. Como você acha que trabalho com uma pessoa que vive na Austrália?

Claramente a comunicação é assíncrona, o que é um grande desafio, mas que no modelo de trabalho remoto funciona quando é em excesso!

O que é indicado no livro Remote? Bem, que sua equipe faça um overlap de ao menos meio-período, ou seja, pelo menos 4h diárias. Se você tem pessoas da equipe na China ou na Austrália é preciso que eles comecem a trabalhar mais e você trabalhar mais tarde para que possam ter esse período de sobreposição de horas. Assim fica melhor para se comunicar, seja através do sistema de comunicação da empresa, fazer uma reunião rápida ou simplesmente tirar uma dúvida.

Mas você deve estar se perguntando como resolver o problema da falta do cafézinho, certo?

Então, esse é um problema que não se resolve. Como diria Steve Jobs: "(...) não se resolve um problema olhando para trás (...)" Para novos problemas, precisamos de novas soluções! Sim, construção de cultura em empresas de trabalho distribuído ou remoto é completamente diferente de construir cultura nas empresas como estamos fazendo pelos últimos 350 anos. Precisamos enxergar novos prismas, conectar novos pontos e entender que a cultura se constrói com pessoas; ou seja, cultura também se constrói com interação online.

Minhas sugestões para empresas de modelo remoto construírem cultura:

  1. Ter encontro semestrais na sede da empresa em que todos os colaboradores conversem, times exponham suas tarefas e desafios e apresentem resultados;
  2. Ter um encontro anual com formato diferente, uma semana inteira de retiro que mistura trabalho e diversão;
  3. Times individualmente podem se organizar e combinarem churrascos aos finais de semana, almoçarem juntos e terem happy-hours em equipe;

Mas, para que você quer um escritório?

Essa é a pergunta que desde março faço a todos os meus amigos e colegas empreendedores. Para qual finalidade você deseja isso?

Veja bem, não estou falando que você não deva ter escritório nenhum, afinal após certo tamanho da equipe é necessário ter um QG, uma base em que pessoas da empresa possam se encontrar. Só não precisa ser sete andares no edifício mais caro da cidade! 😉

A verdade é que a grande maioria dos executivos ainda não possuem confiança o suficiente no time para a construção de um modelo remoto e por isso desejam todos alocados em um escritório. Geralmente essa falta de confiança vem travestida de micro-gerenciamento e relatórios constantes; que se retro-alimenta de um processo de recrutamento ruim, alimentando assim um ciclo vicioso e problemático, caso seja do seu interesse virar sua empresa totalmente para o modelo remoto.

Se você analisar bem, verá que grande empresas boutiques (pense nas grandes consultorias como Accenture, KPMG, EY, Deloitte, McKinsey e outras) em setores como contabilidade, advocacia e publicidade possuem seus escritórios como parte de sua estratégia de vendas; ou seja, seu escritório é ferramenta relevante para impressionar os seus clientes e potenciais clientes. Caso isso seja algo pensado e planejado, faz total sentido (principalmente se você for uma empresa boutique). Caso você seja uma startup ou uma empresa já em estágio de scale-up, em que o atendimento ao seu cliente pode ser feito totalmente remoto ou através de visitas ao escritório dele, não há motivos para você continuar drenando uma linha de seu DRE com escritórios físicos.

Novamente, não estou falando que isso é uma nova ordem mundial. Existem áreas que podem abraçar esse modelo de forma mais eficiente e clara, outras não!

Para finalizar, reforço que para esse tipo de modelo dar certo é muito, muito importante encarar a sua equipe como adultos. Modelos de alta liberdade trazem grande dose de responsabilidade.

Se você é um colaborador de alguma empresa e chegou até aqui, lembre-se, trabalho remoto não é desculpa para se trabalhar menos. Você está finalmente no controle do seu ambiente e dos seus horários, seja inteligente. Migrar para o modelo remoto trás também a responsabilidade de se trabalhar em um modelo por resultados, utilizando ferramentas de gestão que priorizem entregas e não horas de trabalho. Por isso, estude mais sobre o SCRUM, Kanban, Lean, Agile e tudo mais que puder para ajudar a sua equipe sempre a melhorar os processos internos - e não esqueça de documentar!

Esses são apenas meu $0,02 em um assunto que está em alta nos últimos meses. Compartilho com você um pouco do meu playbook e deixo claro que, agora mesmo que a pandemia passar, não quero retornar ao modelo 100% no escritório. Provavelmente seguirei para um modelo misto, iniciando e encerrando a semana no escritório e durante os dias de semana trabalhando de onde desejar.

A vida com liberdade é muito melhor!

Até semana que vem!

Victor Maia

Obs.: Uma das vantagens que observei no trabalho remoto é que como não controlo mais meus dias pela quantidade de horas trabalhadas e sim à entregas feitas, posso me dedicar a mais de um projeto com atenção e cautela, sem comprometer a qualidade das entregas nos demais projetos que estou envolvido. Motivo? Menos micro-gerenciamento da equipe, menos receio de me envolver em atividades terceiras quando estou no escritório, eu controlo meus relógio e eu controlo minhas entregas. No fim do dia o trabalho remoto é um modelo idealmente libertário...

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