Netanyahu tem um plano
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Netanyahu tem um plano

Desde novembro de 2022, logo na sequência das eleições quando se iniciaram as negociações que culminaram na formação do atual governo israelense, venho escrevendo sobre a posição de Benjamin Netanyahu. Isso parece banal; falar do primeiro-min...

Henry Galsky
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Desde novembro de 2022, logo na sequência das eleições quando se iniciaram as negociações que culminaram na formação do atual governo israelense, venho escrevendo sobre a posição de Benjamin Netanyahu. Isso parece banal; falar do primeiro-ministro, do líder mais longevo da história do país. Mas não é. Isso porque entender a mente de Netanyahu é fundamental para se compreender tudo o que está acontecendo no país. Este movimento em curso tem origem num entendimento básico de Bibi sobre ele mesmo: o de que não há ninguém capaz de liderar o país que não seja, bem, ele, Benjamin Netanyahu. 

Grandes manifestações em Israel em oposição ao plano de reforma do Judiciário 
Grandes manifestações em Israel em oposição ao plano de reforma do Judiciário 

Sob o seu ponto de vista, o problema era que, vale lembrar, até as eleições de novembro, ele era o líder da oposição. Oposição a um governo amplo, diverso e que trafegava com alguma facilidade pela arena internacional. Um governo liderado por duas figuras que se aliaram em nome de evitar mais eleições e impedir que ele, Benjamin Netanyahu, retornasse ao cargo de primeiro-ministro. Refiro-me aos ex-primeiros-ministros (que ocuparam o cargo por pouco tempo, mas, ainda assim, lideraram o governo) Naftali Bennett e Yair Lapid.

Desde o primeiro dia daquele governo, Bibi trabalhou arduamente para derrubá-lo. Entre vantagens e desvantagens do parlamentarismo, Israel talvez seja um dos principais exemplos quanto a uma característica deste sistema: a instabilidade. Tanto Netanyahu trabalhou que conseguiu derrubar o governo que, naquela altura, era liderado por Yair Lapid.

Mas Netanyahu não era mais o mesmo líder. Cada vez mais questionado internamente no Likud, seu partido, Bibi não era mais a liderança forte de outros tempos entre os setores e partidos da chamada direita democrática. E aqui pode estar a chave capaz de permitir o entendimento sobre o momento atual. Bibi recorreu a duas lideranças da extrema direita, Itamar Ben Gvir e Bezalel Smotrich, para retornar ao cargo. Mas provavelmente despreza ambos. A extrema direita israelense, empoderada nas eleições de novembro de 2022, deu a Bibi a possibilidade de retornar ao cargo, mas lhe tirou um dos itens que mais preza: a legitimidade na comunidade internacional. A ponto de ser questionado diretamente, por exemplo, pela comunidade judaica norte-americana e pelo próprio governo norte-americano. Bibi ao lado de aliados como Smotrich e Ben Gvir não é bem-vindo nos fóruns internacionais e nem mesmo nos EUA. Não como antes.

Netanyahu precisou de ambos para retornar. Juntos, os partidos de Smotrich e Ben Gvir dão 13 parlamentares à coalizão de governo. Lembrando sempre que o Knesset, o parlamento israelense, possui 120 cadeiras. E basta uma maioria simples de 61 para formar uma coalizão.

É difícil cravar teorias, mas é muito claro que, diante das acusações que Netanyahu enfrenta na Justiça, o projeto de Reforma do Judiciário pode ter influência direta sobre os processos e investigações contra o primeiro-ministro. Ao mesmo tempo, ele certamente sabia que dar sequência a esta reforma provocaria uma enorme polêmica na sociedade, o que está acontecendo agora com manifestações sucessivas e cada vez mais fortes e numerosas. É difícil dizer exatamente o que Bibi pensou, mas, sendo ele um político experiente e com grande capacidade de análise, é seguro afirmar que ele tenha minimamente imaginado essa sequência de eventos (apresentação das reformas e manifestações posteriores, inclusive com oposição por parte da comunidade internacional - e dos EUA sob administração Democrata, importante dizer).

E se Netanyahu imaginou este cenário como um todo? Para ser muito direto: usar a extrema direita até o limite e, no final, diante da grita popular e da pressão internacional, interromper a reforma sob o argumento de que ele, Netanyahu, é uma liderança experiente e sensata que abrirá mão de parte do texto inicial que pretendia aprovar em nome da salvação do país e da pacificação da sociedade israelense. Quem se iria se opôr?

Não por acaso, agora os membros do Likud correm para obter o apoio do Partido da Unidade Nacional, do ex-ministro da Defesa Benny Gantz. A legenda tem 12 membros eleitos no Knesset, o que permitiria a Bibi 1) livrar-se de Smotrich e Ben Gvir e 2) manter uma coalizão de direita estável, mas sem a extrema direita que o impede de circular nos fóruns internacionais e o afasta principalmente dos EUA.

Netanyahu ainda tem a seu favor o plano da Reforma do Judiciário. Pode e deverá usá-lo como moeda de troca em negociações internas. Possivelmente no que diz respeito a seus processos e também no jogo político de Israel. Netanyahu irá procurar seus atuais adversários na direita democrática apresentando ameaças e oportunidades: de um lado, dirá que cabe a eles juntarem-se ao seu governo para salvar o país e frear a reforma; de outro, a oportunidade também será uma ameaça: se não se juntarem ao governo, então que aturem a reforma tal como ela está redigida hoje. Este é o duelo que está em jogo; saber quem pisca primeiro; Netanyahu ou Benny Gantz, o líder do Partido da Unidade Nacional.