Algum tempo depois
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Algum tempo depois

Uiliam da Silva Grizafis
6 min
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Havia passado um ano e meio, Gerard se levanta da cama e se dirige à cozinha, coloca a água para ferver e pega o jornal que estava sobre a mesa para ler. Durante esse tempo o jovem pôs-se a trabalhar, lia muitos livros: literatura inglesa, francesa, brasileira, russa, além dos livros de filosofia que tinha em sua biblioteca. Passou a dar aulas de espanhol e passou a escrever artigos para alguns jornais. Sua mãe, que já não havia mais sofrido com as crises convulsivas entra na cozinha e lhe comenta que lhe havia chegado uma carta. O coração de Gerard disparou, perguntou onde estava, dona Lu, desconcertada, não sabia onde havia posto. De pronto, começam a procurar, “está aqui na cozinha, eu a pus sobre a mesa”, pensava dona Lu. Quando de repente, dona Lu solta um grito: “achei”. A carta havia caído de baixo do fogão à lenha, por pouco a carta não foi queimada. Gerard a agarrou com as duas mãos e leu o nome que estava escrito “De Mari Cedeño para Gerard”. Nosso herói abriu devagar, sentou-se para ler:

Querido Gerard

Minha vida mudou completamente desde te conheci quando estive no Brasil, o mundo se deteve quando me acerquei a ti e, naquele momento, os teus braços se tornaram o meu lugar favorito. Te penso quando deito e quando me levanto, a tua imagem ainda está nítida em meu pensar. Espero que teus sentimentos por mim continuem o mesmo, que não tenhas me esquecido. Durante esse tempo não recebi nenhuma carta tua, então decidi te escrever. Quero voltar a ver-te, se possível, quero que isso aconteça em breve. Quanto a distância, me comprometo a ir visitar-te no Brasil, na verdade, a passagem já está comprada. Meu medo é que tu já tenhas outra mulher, espero que isso não seja verdade. Me espera, chegarei em breve.

Gerard leu a carta com os olhos chamejantes, não imaginou que isso aconteceria, o jovem havia passado todo esse tempo na mais profunda melancolia. No momento oportuno havia encontrado uma esperança para ser feliz. A felicidade, caro leitor, é encontrada, às vezes, nas aventuras que a vida oferece, as aventuras podem ser uma porta de entrada para uma construção sólida; primeiro aventura-se, logo, amadurece-se. O amadurecimento vem com o compromisso de constituir uma família, algo que o nosso herói sempre quis, mas até então tudo parecia ser difícil, a questão não era sobre mulheres, ele poderia encontrar em qualquer lado, o problema era que a mulher que o fisgara não saia de sua cabeça, mesmo tendo suas esperanças jogadas no abismo ao lembrar o quão longe a mulher de sua vida estava. Mas o abismo tem fundo, cabe o desafortunado tentar recuperar seus sonhos, mesmo enfrentando a mais profunda escuridão. Quando se está em trevas não se vê absolutamente nada e o que faz a pessoa continuar? Se é movido pela emoção pode esmorecer, porque a emoção vem e vai, chega e vai embora, em contrapartida, a convicção é o sentimento cravado e impregnado na consciência do homem. A convicção trabalha com a razão, enquanto a emoção, com o coração. Não é errado trabalhar com o coração, ele tem uma função fundamental para as tomadas de decisões, mas não se pode guiar-se inteiramente por ele, deve haver uma balança e, junto com esse sentimento, a razão. Os dois se dialogam em todo momento, devem entrar em um comum acordo, e nas trevas do abismo, muitas vezes, a emoção faz com que o coitado desista, pois não há fundamento, enquanto a razão pensa no futuro, então cria-se o otimismo, sim, otimismo criado pela convicção. O tempo passa e a pessoa não encontra aquilo que está perdido, mas tenta, mesmo com a alma despedaçada, crê que valerá a pena, então quando menos percebe, encontra uma luz atrás de si. De onde vem essa luz? O jovem não sabe, pois perdeu suas forças, mas um ombro amigo acreditou que é possível e essa luz, por fim, ajudou o jovem encontrar sua felicidade. Essa luz foi trazida por Dom Chico. O velho, tinha bagagem, experiência de vida.

- Veja, Dom Chico, recebi essa carta.

Dom Chico a leu e se alegrou mais que o próprio jovem.

- Sabia que Deus tinha um plano para você, a felicidade que você sempre procurou está na sua outra metade. O amor não morre, se desaparece, não é amor, esse, pois, não desapareceu, se manteve firme, e você deve agarrá-lo com todas as forças que há em seu intelecto, não há como perder. É seu.

O velho motivou o jovem que lhe agradeceu. A questão é, caro leitor, - a questão é que o jovem estava na mais profunda depressão, não a ponto se tornar-se um niilista para esquivar-se do desfortúnio, mas a ponto de não acreditar mais em si. Todos precisamos de um amigo, e Gerard sempre gostou da amizade que firmou com Dom Chico porque achava que os mais velhos sempre tinham razão. E, de fato o tinha.

- Uma mulher, formada, talentosa. O que ela viu em mim? – O jovem pergunta a Dom Chico de forma descontraída.

- No amor não há medidas, meu jovem.

O que leva uma pessoa perder suas esperanças. Dizem que o sol nasce para todos, mas a fortuna, nem sempre é encontrada pelos indivíduos. Goethe escreveu sobre um jovem que havia se enamorado por uma mulher comprometida, as cartas, mandadas por esse jovem, transparecia a depressão e o desespero de um coração não correspondido. Temos o pobre Julien, de Stendhal, jovem galante que as mulheres da alta sociedade francesa parecia brincar com seu coração. E Capitu, traiu ou não Bentinho? Sem falar do desastre de Romeu e Julieta. Bom, as bibliotecas do mundo nos mostram os mais profundos prazeres e desprazeres do amor e aqui, há uma mistura de amor e esperança. Qual é o papel, afinal, do amor? Para que veio e qual é sua função? Por que lutamos tanto por ele se um dia a morte separará? A morte faz com que aquele ou aquela que jurou amor ao que agora é defunto se case com outro e jure, também, o amor, isso é permito? Sim, o é! No entanto, a questão ainda é sobre a função do amor. Sabemos que é uma função temporária, talvez, serve para deixar a vida mais leve. Ou a pessoa é destruída pelo amor ou se torna a pessoa mais feliz do mundo. E aqueles que não acreditam no amor, como Vitor, que desapareceu? Como sobrevivem? A questão é que Deus viu que Adão estava só e lhe preparou uma mulher. A partir disso, notamos que o amor é divino, por isso não o entendemos, porque o que é divino foge do nosso intelecto. Não precisamos entender, precisamos desfrutar.